Trocando em Miúdos: A 2ª Feira Antropofágica de Opinião, evento organizado pela Companhia Antropofágica, tem a missão de pensar o Brasil atual. O evento, que acontece de 04 a 07 de junho no Memorial da América Latina, é um sopro de inspiração e lucidez em um Brasil que precisa se reinventar.
Ano de 1968. O terror tomava conta das ruas do país e das almas dos brasileiros. A liberdade, musa imprescindível como nos ensinou Rimbaud, havia sido estrangulada em praça pública. Vivia-se sob a sombra do medo, a todo momento. A lei era a lei da mordaça. O direito? Uma ilusão. A tortura foi institucionalizada no Brasil e os gritos que ecoavam dos porões ainda rasgam os tímpanos de toda a nação.
Este era o contexto político quando o teatro de Arena, comandado por Augusto Boal, convocou artistas e público para a 1ª Feira Paulista de Opinião. O evento foi um sopro de revolta e resistência em um país que agonizava diante dos olhos atordoados, de um povo que se acostumava a ouvir não.

Mais de quarenta anos se passaram. O Brasil reaprende a sorrir diante de suas impossibilidades. O brasileiro ainda se acostuma com o direito, adquirido recentemente, de opinar e se colocar diante do mundo, e a Companhia Antropofágica, grupo maiúsculo da cidade de São Paulo, invoca o espírito livre e guerreiro de Augusto Boal para organizar a 2ª Feira Antropofágica de Opinião. Em fevereiro deste ano, juntamente com o Instituto Augusto Boal, organizaram a 2ª Feira Paulista de Opinião, também chamada de 1ª Feira Antropofágica de Opinião (leia aqui).
O evento, que conta com a direção geral de Thiago Reis Vasconcelos, tem a difícil tarefa de pensar o Brasil, coisa não indicada aos principiantes, como disse Darcy Ribeiro. Músicos, poetas, artitas plásticos e coletivos de cinema encontram-se mergulhados em um caldeirão plural, de onde só podemos sair ainda maiores e mais corajosos diante das opressões e imposições do mundo moderno. Ao todo serão 40 grupos de teatro, 8 grupos musicais, 3 coletivos de cinema, 2 poetas e o inconsciente coletivo de um povo que sente a necessidade de se expressar e reivindicar novas possibilidades de vivência.
“Ao todo serão 40 grupos de teatro, 8 grupos musicais, 3 coletivos de cinema, 2 poetas e o inconsciente coletivo de um povo que sente a necessidade de se expressar e reivindicar novas possibilidades de vivência.”
A feira tem como objetivo, segundo o site da companhia, de “refletir sobre o Brasil atual unindo diversas gerações de artistas”. Entre os convidados estão alguns dos participantes da Feira realizada em 1968, “reforçando a importância do encontro de gerações atuantes no cenário da arte engajada”. É louvável a iniciativa da “tribo” Antropofágica. Vivemos em uma época incerta, onde ódio e amor caminham lado a lado quando nos referimos aos rumos de nossa terra. Pensar nosso povo, nossa identidade e o nosso futuro é algo imprescindível, ainda mais se levarmos em conta o contexto de incertezas e medos que o país cultiva atualmente.
O transe que atravessamos só pode ser entendido através da beleza do palco, dos versos, dos planos iluminados de um cinema que guerreia e do compasso estraçalhado daquela canção que carrega nas costas todas as dores do mundo. O grande barato da vida é recomeçar, por isso é preciso que cada um de nós imposte a voz em resposta ao coro da Companhia Antropofágica que branda aos 7 cantos de Pindorama: O que pensa você do Brasil de hoje?
Daqui, diante da tela embaçada do computador, enxergo um futuro promissor a todos que creêm em uma outra possibilidade de vivência através da beleza e do afeto, em um mundo tão cruel. Tal qual o mestre João Gilberto, enxugo as lágrimas que inundam meu espírito e volto, sempre, os olhos marejados para o amor, o sorriso e uma flor que carrega nas pétalas a esperança que me mantém vivo.
SERVIÇO
2ª Feira Antropofágica de Opinião