“Eu só acreditaria num Deus que soubesse dançar”. – Nietzsche
Não podemos definir o limite do corpo sem experimentar qualquer expressividade que ele pode causar. Movemos o corpo a partir de sensações, de sentimentos e esgotamento físico que nos deixam em outro estado. Para poder experimentar, o corpo se rebela, mostra o que se pode fazer e até onde se pode chegar. Temos que perceber por qual meio a expressão se torna mais acessível. Devemos repetir o movimento e colocar diante das dificuldades, possibilidades que vão se desvincular do modelo lógico. É preciso romper estruturas e conhecer desdobramentos corporais por meio de execuções.
O corpo é ausente, figura imaginativa e física. Energia que se move perante o espaço. Dilatação de vontades. União do pensar, sentir e querer. Sentimentos que ecoam no mundo externo. É dançar, atuar; é presença. Autoconhecimento. É a linha embolada na palma da mão. É teatro. Teatro é corpo, movimento único dilacerado, parado num pequeno silêncio onde o mínimo te toca. É uma experiência nova a cada momento. São fragmentos orgânicos que compõem um único ser. O corpo é palavra, grito que explode na respiração, no ar exprimido no maxilar, na pulsação da criação, no fluxo produtivo dos pensamentos. O corpo caminha em várias direções, converge com outras fontes e compartilha percepções, sentidos, criações e movimentos. Falar de corpo é saber incluir tudo, todos e os demais seres, trazer o de fora pra dentro e reverter num novo, em outro corpo que nos veste. Inserir o estranho, o diferente e o não normal. Saber aceitar e superar desafios para o surgimento de outros olhares. É surpreender o eu e desconstruir paradigmas alojados em cada canto de nosso lugar.
Corpo é ritual que expulsar o inconsciente, o pensamento libertador em carne e osso. É a catarse aniquiladora do prazer.
Corpo é ritual que expulsa o inconsciente, o pensamento libertador em carne e osso. É a catarse aniquiladora do prazer. O corpo purifica o que a mente reivindica. Abre horizontes, dilata percepções. Provoca o ser no espaço em relação ao movimento. Esconde-se na alma, se revela na expressão, distorce, expulsa palavras através de gestos. Direciona-se ao impossível, rompe fronteiras. Insere-se no perigo e arma a poesia no brilho da ação. Através da energia somos levados à adrenalina, nos batemos. Caímos na sensação física do esgotamento. O corpo abre sentidos. Move. Anda perante o tempo. Quebra mágoa e inverte o silêncio. Abre possibilidades para receber desafios. Solta o laço, amarra sonhos, aguenta o limite, ouve, cala, fala o suficiente, grita desesperos, prazer, medo. O corpo adormece. Fica acordado e observa ao redor. Cansaço, rugas, olheiras, dores. O corpo se modifica. Quebra.
Restringir o movimento que o corpo pede, é eliminar a inteligência. É sufocar o espírito e impedir a liberdade. Quando deixamos de nos aventurar na nossa própria capacidade física, deixamos de criar possibilidade, limitamos e vivemos menos do que possa parecer. Não nos asseguramos do que pode o corpo. Não nos percebemos. Censuramo-nos, temos medo do que pode acontecer. Tornamo-nos fracos e sem resistência. O corpo congela diante da ausência, do inesperado, do que não conseguimos segurar.
Para imaginar o que pode o corpo, devemos nos permitir. Achar um ponto de fuga para o que explode dentro da gente, sermos o outro, não nos diferenciar. Conquistar. Fazer justiça para o nosso sacrifício. Lutar. Ter todos os olhares diferentes que nosso corpo apresenta. Se surpreender consigo mesmo. Aproveitar. Transformar o tempo e o envelhecimento. Se desfigurar em alguns momentos desse inapelável corpo. Dessa carne excedente que não é a gente, mas compartilha da nossa biografia e no fim nos leva junto quando morremos. Corpo é arte, é vida. É tudo o que podemos a partir do que sentimos. É mental e físico. São inúmeras possibilidades que podemos descobrir.