Teatro no Ato, a nova série documental do Canal Arte1 sobre o primeiro encontro de um diretor e seu elenco, revela ao público o processo criativo e os mecanismos que envolvem uma montagem teatral. Dividida em oito episódios, com apresentação e direção de João Falcão, a série apresentará as etapas da criação cênica através de textos que marcaram a dramaturgia nacional e internacional. O cenário? O teatro, o palco e, dentro desse palco, o mundo.
Entre o início dos trabalhos de uma peça e o seu “produto final”, aquilo que chega ao público, existe um longo e árduo caminho a ser percorrido. Um processo delicado, digno de uma paciência normalmente creditada aos monges e de uma paixão daquelas que só acometem os amantes mais delirantes.
Fazer teatro é um exercício de fé, além de um ofício como outro qualquer, é claro. São meses dedicados a leituras, estudos, discussões, ensaios e brigas dignas dos melhores dramalhões mexicanos. São noites sem dormir, garrafas acumuladas ou escondidas no fundo do armário, reuniões intermináveis e desespero. Aliás, e novamente, como em qualquer ofício. Mas diferente de muitos trabalhos por aí, há no teatro um lado lúdico, um pequeno paraíso onde pode-se desligar os ouvidos e os olhos daquilo que acontece no mundo.
Ali, naquele pequeno tablado de madeira, podemos tudo. O ato de criar é indiscutivelmente a parte mais interessante de todo trabalho artístico. Por conta dele, submetemo-nos à burocracia do governo, às mandíbulas indestrutíveis dos patrocinadores e às migalhas que disputamos a tapa no dia a dia. Pela necessidade e pelo prazer que existe no ato da criação é que se vive quando se é um artista.
Muitas vezes esse trabalho parece passar despercebido. Revelar esse processo oculto de criação artística é preciso, e é justamente esse o propósito da série Teatro no Ato, coprodução do Canal Arte 1 com a CineGroup, que teve seu primeiro episódio exibido no último domingo (1).
Diretor livre e disposto à entrega, o pernambucano comanda o elenco em mergulhos sistemáticos no interior de personagens que marcaram a dramaturgia mundial e que habitam o inconsciente de todos nós.
O roteiro é simples: a cada episódio o diretor recebe um elenco convidado. Uma vez juntos, Falcão passa a conversar com os atores a respeito da peça, suas abordagens, histórias, causos envolvendo o autor, curiosidades. Tudo é combustível para o trabalho do diretor e sua trupe. O processo segue com algumas leituras do texto escolhido e, em seguida, João propõe cenas.
Diretor livre e disposto à entrega, o pernambucano comanda o elenco em mergulhos sistemáticos no interior de personagens que marcaram a dramaturgia mundial e que habitam o inconsciente de todos nós. Ao fim do processo, o grupo apresenta uma “versão finalizada” da peça. As obras escolhidas são: Romeu e Julieta, de William Shakespeare; Assim é (se lhe parece), de Luigi Pirandello; A Ver Estrelas, de João Falcão; Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues; O Burguês Ridículo, de Molière; Édipo Rei, de Sófocles; O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna; e A Dona da História, de João Falcão.
A coisa é de sopetão: tudo acontece no mesmo dia. Os atores recebem o texto cedo, em seguida vão ao teatro e entram em processo de montagem até o fim do dia quando, enfim, apresentam o resultado final da empreitada. Tudo isso num dos palcos mais icônicos do Brasil: o Teatro Ipanema. Por lá brilharam, durante os anos, constelações de homens e mulheres que são indissociáveis da história das artes cênicas do país e que deixaram por lá não só a marca de seus passos pelas aberturas da madeira, mas também uma história de devoção e resistência em nome dessa arte que desconhece limites.
A escolha de João Falcão cai como uma luva para o que a série se propõe. Diretor indisposto a dogmas ou verdades inquestionáveis, o que se vê na tela, ao menos no primeiro episódio da série, é um homem de teatro entregue ao seu ofício e, principalmente, a seus colegas. O diretor, que terá o desafio de dirigir duas peças de sua autoria no decorrer de Teatro no Ato, joga para o time e não busca o brilho solitário: entrega-se por inteiro e chega a misturar-se com a coisa a ponto de não sabermos onde começa o homem e o onde o teatro termina.
Teatro no Ato é isso: uma declaração de amor a cena disponível na claridade do vídeo.