Better Things, produção da FX, é uma daquelas séries pouco conhecidas do grande público, mas que conseguem se tornar um momento cativo na vida de quem a assiste. Sem muitas pretensões, o seriado acompanha a rotina da atriz e dubladora Sam Fox (Pamela Adlon), mãe solteira de três filhas, que se vira como dá para manter alguma sanidade num cotidiano marcado pelo caos (pelas filhas adolescentes que requisitam mais do que ela pode dar, pelos cuidados com sua mãe, por quem ela nutre tanto amor quanto ódio e pela impossibilidade de conciliar tudo isso com sua própria vida).
Assim, Better Things cativa, como já comentei em texto sobre a primeira temporada, porque [highlight color=”yellow”]de alguma forma diz respeito à vida de todas as mulheres.[/highlight] Não à toa, a figura masculina na série é quase inexistente. É impossível não ter alguma identificação com os pequenos grandes dramas que envolvem a vida de Sam. A própria personagem, aliás, atrai o público porque é muito carismática e super cool. Está sempre vestida com um figurino descolado e é toda moderna em tudo que faz (ainda que suas filhas – como todas as filhas – pareçam ter vergonha dela) e vive numa casa maravilhosa na Califórnia.
Ou seja, Better Things comove justamente pelo retrato poético que faz, sutilmente, dos conflitos que cercam a vida adulta, especialmente a das mulheres. As mães solteiras, sobretudo, podem desenvolver maior identificação: não são poucos os perrengues pelos quais Sam passa para conseguir agradar, quase sempre sem sucesso, suas três filhas, cada uma vivenciando uma fase e dramas diferentes.
Conforme esperado, na segunda temporada, ela precisa encarar que as meninas estão crescendo. O primeiro drama diz respeito ao fato de que a filha adolescente, a desmiolada Max (Mikey Madison), está saindo com um cara bem mais velho. Moderna e arrojada, Sam não sabe como demonstrar sua preocupação sem parecer tão antiquada como sua mãe. Logo mais, ela enfrenta a consciência de que as filhas não parecem expressar afeto por ela nem demonstram qualquer interesse em sua carreira. O estresse que acomete Sam é tão intenso que chega a nos contaminar do lado de cá da tela. Mas – é o que a narrativa de Better Things parece nos dizer – no meio de tanto caos e algazarra, há sempre um lampejo de beleza que faz tudo valer a pena (preste atenção no episódio do velório, que é sublime).
O que a narrativa de Better Things parece nos dizer é que no meio de tanto caos e algazarra, há sempre um lampejo de beleza que faz tudo valer a pena.
Se a primeira temporada nos apresentava Sam e seu universo feminino, [highlight color=”yellow”]a segunda tenta desenvolver melhor os seus dramas e suas histórias[/highlight], inclusive a familiar. Sam se vê provocada a enfrentar a possibilidade de um amor masculino e, claro, não sabe muito o que fazer. Vale observar a sutileza do roteiro: todas as figuras masculinas em torno de Sam são frágeis (como o ex-marido, sustentado por ela; o irmão, que é rompido com a família), gays (seu melhor amigo) ou inexistentes (a figura da mãe é crucial na série, mas o pai de Sam nunca aparece). Assim, pela primeira vez em muito tempo, ela precisa lidar com o fato de que finalmente deseja alguém que respeita e que pode lhe oferecer amor na mesma medida – e como lidar com uma expectativa tão grande? Como abrir espaço em uma vida que se acostumou a ser sozinha?
[box type=”note” align=”alignright” class=”” width=”350px”]
Leia também
» ‘Better Things’ comove ao narrar a vida de todas as mulheres
» Procuram-se: mulheres complexas e reais nas séries
[/box]
Outro destaque está na personagem Phyllis (Celia Imrie), a mãe britância de Sam, que é melhor desenvolvida nesta temporada, inclusive com um episódio dedicado todo a ela. Phyllis é representada como irritante quase todo o tempo, mas a narrativa de Better Things a observa sob um olhar enternecedor, sem julgamentos, que consegue nos explicar a sua profunda solidão e nos faz sentir a sua dor. Além disso, há uma discussão importante acerca do desespero que atinge àqueles que estão perdendo a sanidade. Este é o grande trunfo da série: as personagens são construídas sob matizes extremamente realistas, nem bons nem maus – exatamente como a gente.
Assim, a segunda temporada de Better Things faz jus a uma série que já havia cativado os corações e as mentes de seus escassos espectadores. Com apenas dez episódios, ela traz o desejo de que uma nova temporada chegue logo para que possamos voltar a acompanhar a agridoce trajetória de Sam e de sua trupe de mulheres.
Trailer de ‘Better Things’
https://www.youtube.com/watch?v=WSJOerMupzs