Provavelmente a HBO está tentando dominar as premiações de cabo a rabo em 2019 e 2020. E deve conseguir. Para somar mais um fenômeno na lista este ano — que já conta com Game of Thrones e Big Little Lies — agora surge Euphoria, série sobre adolescentes, mas não indicada para adolescentes (já falamos sobre ela aqui). É quase uma temporada de Skins, só que muito melhor. É tudo aquilo que 13 Reasons Why tentou ser e nunca conseguiu.
Criada por Sam Levinson (Assassination Nation), Euphoria mostra o cotidiano de um grupo de estudantes do Ensino Médio à medida em que eles exploram novos amores e amizades em um mundo de sexo, drogas, traumas e mídias sociais. Parece clichê, mas a série derrapa poucas vezes neste terreno. Na maioria das vezes, ela consegue equilibrar o drama adolescente e a intensidade dos jovens com uma trama poética e uma estética capaz de transformar todas as cenas em pequenas obras de arte.
A protagonista de Euphoria é a jovem Rue (interpretada por Zendaya, estrela da Disney), uma adolescente de 17 anos que acaba de sair de uma clínica de reabilitação após sofrer uma overdose. Mesmo com o apoio da mãe e da irmã, a garota sofre uma depressão profunda desde antes do pai falecer. Desse modo, Rue continua se drogando. Sua vida começa a melhorar depois que ela conhece Jules (Hunter Schafer), uma garota transexual que se muda pra a cidade de Rue. As duas acabam criando um laço de amizade profundo, mas quando Rue se apaixona por Jules, as coisas começam a ficar delicadas.
No meio de tudo isso, temos ótimos e complexos personagens, como Nate (Jacob Elordi), um sociopata filho do magnata da cidade, que nunca ouviu a palavra fracasso na vida; Cassey (Sydney Sweeney), uma garota com problemas familiares, especialmente com o pai, que acaba procurando aceitação em outros homens; Kat (Barbi Ferreira, filha de pai brasileiro), uma garota que sofre gordofobia sua vida toda, mas que começa a se empoderar, mesmo que de maneira um tanto quanto questionável; e Maddy (Alexa Demie), a típica adolescentes frustrada que vive da aceitação dos outros.
O grande acerto da série, de longe, é sua estética experimental, cinematográfica e sufocante. Com muito neon, luz azul, glitter e câmeras girando sem parar, Euphoria acaba sendo uma experiência interessante, mesmo para aqueles que não se interessam muito pelos drama adolescentes. O quarto episódio, chamado Shook One: Pt II, talvez seja um dos melhores episódios de série de todo ano. A produção é poderosa e incômoda quando mostra situações extremas, ao mesmo tempo em que é calma e reflexiva em seus momentos de silêncio.
O grande acerto da série, de longe, é sua estética experimental, cinematográfica e sufocante. Com muito neon, luz azul, glitter e câmeras girando sem parar, Euphoria acaba sendo uma experiência interessante, mesmo para aqueles que não se interessam muito pelos drama adolescentes.
Embora Euphoria mostre cenas pesadas sem nenhum pudor (estamos falando de HBO), a série consegue contextualizar de maneira certa. Diferente da irresponsabilidade de 13 Reasons Why, apenas para citar uma série adolescente popular, Euphoria não glamouriza, romantiza ou incentiva comportamentos perigosos e autodestrutivos, ainda que a série pareça fazer isso quando não olhamos com atenção. Há um comovente cuidado na construção do texto, fazendo com que os personagens jovens pensem e analisem sua vida sob um aspecto próprio, fazendo eles mesmos julgarem suas atitudes e não nós. Temas como a transexualidade de Jules, por exemplo, não são jogados na cara do público de uma maneira óbvia. A questão, aliás, é um mero detalhe.
A série aborda bullying, drogas, depressão, machismo, relacionamentos tóxicos e mais uma porrada de coisas sem nunca soar panfletária. Seus episódios são orgânicos, estruturados de maneira criativa e compreensiva. Todos aqueles adolescentes tem sérios problemas, mas podemos entendê-los quando visitamos o passado de cada um deles.
A câmera passeia pela vida daqueles jovens de maneira frenética e verdadeira, garantindo fluidez e em episódios com uma hora de duração. A trilha sonora é outro imenso acerto dentro da série, com músicas a favor da narrativa e daqueles personagens. Mesmo que trilha pareça exagerada em alguns momentos, ela está sempre ali para que possamos entender mais o que aqueles personagens estão passando.
Com uma atuação absurda de Zendaya e um texto pulsante, Euphoria carrega o retrato de uma geração perdida buscando aceitação.