A onda de true crimes parece cada vez maior na TV em todo o mundo, mas em especial nos Estados Unidos. A Friend of the Family é um destes casos. Original Peacock, braço de streaming da NBC, a minissérie reconta a perturbadora história de Jan Broberg e sua família.
A trama não chega a ser uma novidade na dramaturgia, já que a Netflix lançou, em 2017, Sequestrada à Luz do Dia, um documentário que relata os fatos trazidos na minissérie.
A Friend of the Family não é fácil de ser digerida. Talvez por esta razão, seu episódio inaugural traga a real Jan Broberg para dizer o disclaimer. “Eu sei que pode parecer inacreditável, mas vivíamos em um mundo diferente naquela época”, inicia a agora adulta Jan. “Estou contando a história da minha família hoje, porque muitas pessoas acreditam que isso nunca poderia acontecer com elas”.
Sim, um dos impactos causados pela narrativa é a incredulidade. Mas retornemos um pouco para situar o leitor que desconhece os fatos. Em meados dos anos 1970, Bob e Mary Ann Broberg tinham uma vida suave e tranquila no sudoeste de Idaho, juntamente com suas três filhas.
Assistir A Friend of the Family com a bagagem do século XXI torna-a mais desoladora.
Mórmons, conheceram em sua comunidade a família Berchtold: Bob, apelidado de “Irmão B”, Gail e os três filhos deles. Não demorou que as famílias se tornassem grandes amigas, unidas na fé e nas relações sociais. Porém, algo muito sério viria a acontecer.
Em pouco tempo, Bob Berchtold desenvolveu uma obsessão por Jan, que à época tinha apenas 12 anos. O problema era tão sério que sua fixação doentia sobre a garota só aumentou, a ponto dele a sequestrar e fazer uma espécie de lavagem cerebral nela.
Berchtold fez a menina acreditar que a sobrevivência de uma civilização alienígena dependia dela concordar com os avanços sexuais do “amigo da família”. Algum tempo depois, Jan retorna à sua família, mas já sob efeito da manipulação do Irmão B.
Aqui a história narrada em A Friend of the Family se torna, ao mesmo tempo, fascinante e assustadora. Berchtold não agiu apenas na garota, ele enredou toda a família Broberg em seus planos para ter Jan. Para obter o que deseja, Bob Berchtold manipula toda a família, construindo mecanismos que impediriam a ação deles.
Somos levados a um tempo em que nem mesmo o termo “pedófilo” havia entrado no léxico, o que faz com que a condução das investigações e a reação da família se dê num âmbito de choque. Religiosos fervorosos, o medo da reprovação da Igreja também permeia suas ações (ou não ações).
A Friend of the Family é criada por Nick Antosca, que já tinha no currículo outros trabalhos em true crime, como The Act. Se o público considerou Sequestrada à Luz do Dia, por seu caráter, muito condescendente com as atitudes de Bob e Mary Ann, talvez a visão de Antosca para os acontecimentos possa ser frustrante.
A minissérie é bastante empática com a família Broberg, não estando interessada em entender suas decisões mais desconcertantes. Essa sutileza em conseguir captar o absurdo e nos apresentá-lo sob a ótica de quem viveu oferece contornos dramáticos que nem mesmo o documentário foi capaz de entregar.
A isso, é importante ressaltar a impressionante atuação de Jake Lacy no papel de Bob Berchtold. Ele é assustador, sádico, manipulador, sem nunca tirar o sorriso do rosto. Merecem destaque, também, Hendrix Yancey, que interpreta Jan na versão mais jovem, Lio Tipton, como Gail Berchtold, além Anna Paquin.
Assistir A Friend of the Family com a bagagem do século XXI torna-a mais desoladora. É uma produção densa, angustiante e potente. Um alerta, como diz a própria Jan no início da minissérie, de que o mal pode estar à espreita.
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