Há um movimento que tenho observado como cada vez mais forte na televisão, aberta e fechada. Parece que os canais estão sedentos por “mimetizar” uma estética e uma linguagem vindas da cultura digital, carregando assim a internet para a TV. Por que fariam isso? A resposta mais óbvia talvez seja correta: é uma tentativa de angariar um público jovem que já não coloca a televisão como sua primeira opção de entretenimento. Muitos jovens, inclusive, se orgulham de não ter aparelho de TV em casa.
Mas não é fácil fazer essa transição, e a verdade é que a maior parte dos programas que tentam criar essa convergência com as linguagens digitais acabam se tornando forçados, mesmo preguiçosos (como se exibir “vídeos bombados da internet” fosse algo original). De todo modo, o fato é que a maior parte das emissoras parece já ter compreendido que não dá mais para fazer sucesso na TV se não viralizar na internet.
Dia desses, me deparei com um programa novo na Rede TV! que, à minha visão, consegue capturar melhor que seus concorrentes como fazer isso. Falo do Foi Mau, uma espécie de talk show diferentão e despretensioso, realizado pelo humorista Maurício Meirelles (que foi, dentre outras coisas, repórter no CQC).
Foi Mau consegue fazer rir com facilidade e, por ter um formato fragmentado, facilita que também circule na internet e gere muitos compartilhamentos
Foi Mau já começa com Meirelles, no primeiro episódio, fazendo troça consigo mesmo: a abertura, repleta de autoelogios, já é sucedida por uma tiração de sarro com a própria RedeTV!, como se ela fosse um diagnóstico do seu fracasso na TV. Os equipamentos são ruins, segundo brinca (como se usasse uma câmera instalada no seu carro para filmar), e a audiência é pífia.
O tema “fracasso”, aliás, é bastante recorrente. Em todos os programas, os convidados centrais (duas celebridades que são entrevistadas num cenário escasso) são convocados para listar quais seus maiores fracassos na vida. Por sorte, todos os participantes parecem propensos a se expor nesse nível – muitos, inclusive, listando episódios escatológicos.
A chave para a compreensão do Foi Mau, ao que me parece, se centra em dois aspectos. A primeira é entender a tosquice como uma regra e mesmo como um estilo. Maurício Meirelles está assumidamente encarando a simplicidade do seu programa como sua força. Um dos quadros mais divertidos de Foi Mau é justamente o que se inspira em um dos sucessos recentes de Meirelles na internet, que é seu talento para a “trolagem”, ou seja, a pregação de peças em pessoas desavisadas. Em um dos episódios, Meirelles e uma mãe montam um trote para passar no filho gamer, e conseguem que ele passe vergonha em troca de dinheiro.
A segunda chave para se entreter com Foi Mau é estar por dentro nesse universo da cultura bem popular da internet. Isto quer dizer: é preciso estar familiarizado com o culto debochado a figuras de reality shows, da música de má qualidade, etc. Não à toa, Meirelles já entrevistou Luiza Ambiel (ex-A Fazenda e Domingo Legal), Felipe Prior e Hadbala (ex-BBBs), MC Livinho (funkeiro), Fernanda Lacerda, a “Mendigata” (ex-A Fazenda e Pânico na TV).
Todos são bem-sucedidos ao adentrar na proposta do programa, que tem um humor meio “piá de quinta série”. Por exemplo: Prior e Mauricio Meirelles passam um trote em Victor Hugo, ex-participante do BBB que ficou conhecido como “planta” (ou seja, sem graça, dispensável) para que ele faça um comercial de pizzaria em troca de apenas 5 pizzas. Com Luiza Ambiel, eles pregam uma peça na diarista dela sobre um vibrador que ela teria perdido.
Todos nós já passamos por essa fase de achar muita graça neste tipo de humor bem juvenil – e na internet (e agora também na TV aberta) conseguimos reviver essa etapa da vida por alguns minutos que seja.
Vale aqui também pontuar que Foi Mau parece atingir aquilo que Casa Kalimann foi planejado para ser e não consegue. Se Mauricio Meirelles aparenta confortável na sua posição de “trolador” (afinal, é um comediante), Rafa Kalimann soa forçada e roteirizada o tempo todo. No episódio de Casa Kalimann com Fabio Porchat, Rafa faz uma piada com o tamanho da própria cabeça – e esse parece o máximo de tiração de sarro com si mesma que a influencer consegue fazer. Mesmo assim, não tem a menor graça.
Foi Mau cumpre a missão de fazer rir com facilidade e, por ter um formato fragmentado, facilita que também circule na internet e gere muitos compartilhamentos – o que, no fim das contas, é o novo “IBOPE” que todo mundo corre atrás. Desejo que Mauricio Meirelles continue encontrando muitos convidados bem propensos a cair nas suas trolagens.