Mesmo que Homeland não viva mais seus momentos de glória como em suas primeiras temporadas, a série ainda chama atenção dos críticos, sendo frequentemente lembrada em premiações e listas de melhores produções. A coragem dos autores Howard Gordon e Alex Gansa em reinventar a série também é admirável, já que desde a quarta temporada a série escolheu caminhos menos óbvios e tramas mais complexas.
Admirável, também, é o talento do programa em tratar de temas dolorosamente reais, como na excelente quinta temporada, em que pareceu prever os atentados de Berlim, em 2016. Tudo isso faz de Homeland uma série inteligente, que tenta encontrar um equilíbrio entre um drama elegante e classudo e também entregar um thriller nos moldes de 24 Horas. O resultado é sempre muito interessante, mesmo que os roteiristas derrapem um pouco no meio do caminho.
O sexto ano, como de costume, tentou imaginar o que aconteceria no cenário político, mas errou de presidente. Assim, a série começa alguns meses após os fatos ocorridos em Berlim. Carrie (Claire Danes) está morando no Brooklyn tentando levar uma vida normal com sua filha Franny. A protagonista trabalha em uma fundação que ajuda os imigrantes muçulmanos a se adaptarem à cultura norte-americana.
Ao mesmo tempo, a ex-agente da CIA aconselha a futura presidente dos Estados Unidos, Elizabeth Keane (Elizabeth Marvel), a respeito de diversos assuntos, especialmente política internacional, tendo que lidar com Dar Adal (F. Murray Abraham) e Saul Berenson (Mandy Patinkin). A prisão de um jovem muçulmano também coloca Carrie dentro de uma trama institucional bastante interessante. Como se não bastasse, ela ainda precisa lidar com seu amigo Peter Quinn (Rupert Friend), torturado e quase morto na temporada passada e que agora enfrenta as sequelas de um derrame cerebral.
Mesmo com algumas oscilações, Homeland consegue manter um nível acima da média para produções com esta idade.
É curioso perceber como Homeland tinha certeza de que Hillary Clinton assumiria a maior potência do mundo, mas é mais curioso ainda como, mesmo com o erro na previsão, a série toma caminhos que vieram de fato a acontecer. Sem subestimar seu público, o seriado mostra uma temporada bastante política, indo para um caminho mais sutil e que exige a participação do público, já que uma distração pode fazer a audiência se perder em toda aquela discussão.
Não é uma temporada cheia de explosões e perseguições (embora haja diversos atentados ao longo dos 12 episódios), mas traz tópicos pesados, como o poder das mídias sociais, mais precisamente o poder destas mídias em disseminar conteúdos mentirosos e como elas geram uma cultura do medo e uma máquina gratuita para transmitir o preconceito para diversos grupos, especialmente os muçulmanos.
Há, ainda, uma guerra silenciosa entre a primeira presidente mulher eleita nos EUA e os órgãos de inteligência, que não concordam com sua visão de mundo e sua forma de fazer política. Conforme a temporada avança, mesmo tendo sido eleita pelo povo, a presidente começa a ganhar a antipatia dos norte-americanos, recebendo protestos com gritos de “Não é a minha presidente”. Para completar, a governante também acusa a imprensa de produzir notícias tendenciosas sobre o governo ou tentar deslegitimar sua gestão. Tudo isso soa muito familiar.
Mas se a trama política é interessante, Homeland traz algumas ações paralelas que são bem executadas, mas que apenas servem de distração para o tema central. Um exemplo claro é o ótimo episódio em que Peter Quinn perde o controle emocional enquanto cuida da filha de Carrie e acaba causando uma confusão entre a polícia exatamente no dia em que Nova Iorque sofre um atentado. O episódio é tenso, como Homeland sabe fazer de melhor, mas parece deslocado do resto da trama, gerando consequência para Carrie que a distraem da história original.
Peter também se torna um personagem complexo e comovente, mas alterna momentos insuportáveis em que gera o ódio do público, já que suas ações são extremamente reprováveis. Este balanço entre um thriller político e um thriller de pura ação funciona, mas até hoje Homeland não conseguiu dosar ou incorporar os diferentes plots de forma mais eficiente.
E mesmo seis anos depois de sua estreia, Claire Danes continua interpretando Carrie de corpo e alma e chega a ser ofensivo não indicá-la a premiações este ano. Nesta temporada, ainda que vejamos uma personagem muito mais centrada e serena, é perceptível e admirável como ela se mostra machucada por tudo o que já passou. Não há diálogos expositivos para isso, mas Danes deixa claro nas suas feições, no seu modo de andar e até mesmo no modo de reagir a determinadas situações. Se nas temporadas passadas os roteiristas davam um jeito de Carrie entrar em uma crise por causa da sua bipolaridade, este ano a personagem perde o controle por motivos bem menos esperados e que exigem da atriz um domínio admirável de se ver.
Homeland também vem inserindo em suas tramas mulheres de personalidades fortes e marcantes (lembrando que Claire Danes é produtora executiva da série). Dessa forma, o sexto ano traz uma Elizabeth Marvel como a futura presidente extremamente inspirada, começando de maneira mansa e até manipulada pelas pessoas, para logo depois se mostrar uma mulher perigosa e controladora, e sua linguagem corporal vai mostrando as mudanças sutilmente. E é por causa dela que, mesmo com um final de temporada um pouco morno, ficamos chocados com sua postura dogmática e censurável, que lembra muito as ações de Donald Trump e que pode levar a série para caminhos interessantes nos próximos anos.
Por tudo isso, mesmo com algumas oscilações, Homeland consegue manter um nível acima da média para produções com esta idade, especialmente depois de uma temporada com menos fórmulas prontas, terminando com um ótimo gancho e com infinitas possibilidades. Afinal, competindo com a realidade cada vez mais, o show já entendeu que nada do que eles mostram pode ser considerado surreal.
Em tempo: a série já está renovada até a oitava temporada.