Não importa qual seja a sua opinião sobre o Big Brother Brasil. Uma coisa é fato: é difícil achar um programa tão “orgânico” e que tenha se alterado tanto ao longo dos anos – mesmo que pareça sempre permanecer o mesmo. Em 21 anos de exibição, o reality show conseguiu passar de símbolo do que há de mais execrável da TV brasileira (significado coletivamente como um “programa sobre nada”) a uma atração que conseguiu se tornar cult, mobilizando um debate e uma torcida pouco vista em outros produtos da mídia.
Em 2020, uma jogada arriscada acabou se tornando um grande trunfo do BBB. A criação de dois blocos de entrada de participantes separou os membros “pipoca” (os anônimos, a “matéria prima” do reality show por décadas) dos membros “camarote” (pessoas famosas que agora também participariam desta empreitada). Inicialmente, a ideia parecia injusta – como poderiam reles mortais concorrer com gente com milhões de seguidores nas redes?
Mas logo se descobriu que essa premissa era falsa. Milhões de seguidores não são páreo para essa máquina de intimidade chamada Big Brother Brasil. Não por acaso, as duas vencedoras das últimas edições – Thelma e Juliette – eram membros “pipoca”. A vantagem de ser famoso, portanto, só se estende até a entrada na porta do BBB.
A grande questão aqui talvez seja: ora, por que um famoso entraria num reality show de confinamento? As vantagens certamente são menos financeiras – pois 1,5 milhão de reais talvez não seja um grande faturamento para boa parte dos artistas convidados ao programa – e têm mais a ver com gerenciamento de carreira. Estar na casa do BBB é uma forma de “desnudar-se”, ou seja, expor-se para além da faceta performática que um artista se acostuma trazer ao público como parte fundamental do seu trabalho. Mas desnudar-se em público é sempre uma faca de dois gumes.
O impacto da entrada dos famosos
![Tiago Abravanel é consolado pelos colegas "pipoca" Tiago Abravanel é consolado pelos colegas "pipoca"](https://escotilha.com.br/wp-content/uploads/2022/02/Tiago-BBB-1024x538.jpg)
Em um mundo no qual a exposição da privacidade virou moeda, parece um bom investimento estar numa vitrine nacional como é a casa do Big Brother Brasil. É, no mínimo, ter a chance de tornar-se um nome repercutido em todos os cantos do país – e, portanto, pode significar ganhos futuros para além do programa. Visibilidade, portanto, tornou-se um prêmio bom o suficiente.
A proposta de levar os membros famosos para o BBB pode ter parecido uma boa jogada para a Globo – afinal, garante que o programa já comece “aquecido” com torcidas, debates e especulações. Mas, passados três anos, o que se vê são alguns ônus desta decisão, como a maior presença de “plantas”. A saída de Bruna Gonçalves, participante famosa por ser casada com a cantora Ludmilla, é uma prova disso: ela passou incólume de tudo o que rolou na casa e foi eliminada sem grandes prejuízos. Apenas se tornou mais famosa e deve faturar mais dinheiro com o status de ex-BBB.
Em um mundo no qual a exposição da privacidade virou moeda, parece um bom investimento estar numa vitrine nacional como é a casa do Big Brother Brasil.
E, claro, não podemos esquecer do paradigma trazido por Karol Conká no BBB 20: uma cantora de reputação altíssima que saiu com sua carreira devastada por conta de sua postura nociva na casa. De símbolo máximo do feminismo no Brasil, ela foi reconfigurada a vilã nacional no espaço de um mês.
Creio que tudo isso deve ser levado em consideração para analisar a saída de Tiago Abravanel do Big Brother Brasil 22, após apertar o botão pelo qual decide desistir no programa. Tiago, mesmo que não soubesse exatamente disso, está na leva dos que perderam com sua entrada num programa desse tipo.
O neto de Silvio Santos consolidava, até então, uma carreira como cantor e apresentador simpático e talentoso, mas, ao expor sua intimidade no reality show (sua faceta “arco-íris” e a recusa de encarar conflitos), foi lido pela audiência como um “inimigo do entretenimento”, mais um termo do léxico do BBB para designar as pessoas que conspiram contra a graça do programa.
Não se pode acusar Tiago Abravanel de não ser “autêntico” – aquela palavrinha de ouro que parece guardar em si todo o segredo deste formato – dentro da casa. Ele se revelou inseguro, magoado (inclusive expôs as tretas familiares do clã Abravanel), narcisista e bastante carente. Ao se sentir preterido em provas e ao resvalar num lapso (chamou Lina de “ele” e foi corrigida por ela, em tom de brincadeira), ele não segurou a barra e optou pela desistência.
A saída de Tiago Abravanel, creio eu, é a vitória do antijogo. Sua decisão foi certa – para ele, não para o programa. Aqui fora, ele deixa de queimar a sua imagem como quando estava no programa (menos por decisão sua, e sim pela leitura feita pelo público de seu personagem) e começa a ter algum tipo de controle novamente de sua reputação. Mas fica no ar a reflexão para a TV Globo: será que colocar famosos entre os participantes foi uma boa ideia?
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