Antes de tudo, quero me apresentar: já era colaboradora de A Escotilha e sou jornalista cultural há cinco anos. Escrevo sobre artes visuais e cinema, mas a alimentação e nutrição é um tema de interesse e pesquisa. Que fique claro: sou jornalista, não nutricionista! Sou apenas uma entusiasta e, neste espaço, vamos refletir sobre o assunto. Também vou trazer textos de livros e filmes que tratam do tema. Sejam bem-vindos! =)
Quero convidar o leitor homem a se colocar no lugar de uma mulher nas situações que vou descrever abaixo. Ou, caso você, leitora, não tenha tido essa percepção, me acompanhe (e também discorde se quiser). Nós passamos por essas situações diariamente, o que explica, e muito, o fato de sofrermos mais com transtornos alimentares do que os homens (segundo a Organização Mundial da Saúde). Vamos lá:
Uma mulher faz um trajeto em que cruza com várias bancas de jornais e revistas. Montes são sobre Dietas. Montes mesmo, uma boa parte das revistas da banca, aliás. Estampando a capa, sempre uma outra mulher, geralmente pessoa pública, com um corpo dentro do padrão estético vigente, servindo como um exemplo a ser seguido. Dia desses, comprei uma delas – na capa, a cantora Anitta, que perdeu peso com um cardápio equilibrado e exercício. Só um detalhe: uma cozinheira viaja com ela. Mas você, pobre mortal, pode atingir o mesmo seguindo o regime, e tendo a tal da ~força de vontade~ (só deixando claro: gosto da Anitta. Minha intenção foi reforçar que este é um privilégio que poucas de nós temos).
Entre em uma livraria: a mesma coisa. Fileiras de livros sobre as últimas promessas de emagrecimento.
Entre em uma livraria: a mesma coisa. Fileiras de livros sobre as últimas promessas de emagrecimento – na televisão e, o pior de todos, nas redes sociais: é só abrir o feed do Instagram para ver blogueiras e suas refeições “exemplares” te convidando a fazer o mesmo, sempre seguidas por fotos despretensiosas de biquínis num corpo perfeito. Te acusando, sempre: “quem quer, faz”, parece o mantra. E você morta de culpa porque no dia não deu mesmo pra ir à academia.
Algumas organizações de saúde falam que estamos em um ambiente obesogênico (abordarei o tema mais adiante aqui neste espaço), que contribui para o problema considerado, hoje, de saúde pública. Há publicidade de produtos alimentícios em todos os cantos. Em paralelo, nós, mulheres, vivemos também em um ambiente “dietogênico” (inventei o termo agora e, muito provavelmente, ele não existe). O fato é que parece que somos, o tempo todo, obrigadas a fazer dietas e restrições. Claro que os homens também sofrem pressões com padrões de beleza e com distúrbios alimentares. Mas tenho impressão que o diet talk é bem mais comum nas rodinhas femininas.
O prato – e o peso – feminino também é objeto de vigilância de maneira mais constante: fulana come pouco/fulana come muito/ fulana come muito açúcar/minha tia me acha gorda/minha vó disse que eu engordei/não pode comer muito em festa/não pode comer muito na frente do boy/seja delicada coma pouco/primeiro encontro pede só uma salada/nossa, sua irmã engordou/vou parar de dar exemplo porque são infinitos.
Como diz a nutricionista Sophie Deram em seu excelente livro O Peso das Dietas, o cumprimento não é mais: “bom dia, tudo bem?” e sim, “bom dia, você engordou/emagreceu?”. Precisamos, urgentemente, parar de fiscalizar a aparência e os pratos alheios, principalmente, o das mulheres.
O problema é que estamos inseridas nesse ambiente “dietogênico” onde não fazer alguma restrição alimentar e estar em paz com a sua alimentação parece motivo de vergonha. Por isso, quando li em Mulheres Francesas Não Engordam, da executiva Mireille Giuliano, que, por lá, a lógica é inversa, fiquei surpresa. Isso não significa que elas comem sem limites o dia todo, é claro. A questão é que precisamos, urgentemente, pensar em um ambiente mais propício para que possamos ir a um almoço ou café sem se punir publicamente. Celebrar o ato de comer, e não entendê-lo como uma vergonha ou culpa.
Até quinta-feira que vem e bom apetite pra todo mundo!