Parou o carro em frente à clínica de vacinação.
– Pronto, já estamos aqui. Agora você vai tomar a bendita da vacina da gripe.
– Não vou. Já falei que você não vai me obrigar.
Deu uma porrada no volante.
– Larga a mão de ser ridículo! Você tá me fazendo passar vergonha. Solta esse cinto de segurança agora.
– Mãe, é um direito meu.
– Deixou de ser na hora que eu paguei pela porra da vacina.
– Capitalista!
Na semana anterior, ele havia chegado até a sala de aplicação, mas saiu correndo. A dose já estava paga.
– Escuta aqui, Dudu, você vai descer desse carro agora, nós vamos entrar na clínica e eu não vou sair de lá enquanto você não estiver totalmente protegido contra a H1N1.
– Então você vai ficar lá dentro pra sempre, porque eu não vou tomar essa merda.
Arrancou o celular da mão dele.
– Só devolvo depois de vacinado.
– Isso é um absurdo!
– Absurdo é esse medo de injeção. Tem nenê que faz menos escândalo que você quando vê agulha. Você não é mais nenê, Dudu.
– Não é medo. É aflição.
Destravou as portas e chacoalhou a mão para a frente.
“- Mãe, é um direito meu.
– Deixou de ser na hora que eu paguei pela porra da vacina.
– Capitalista!”– Vai, desce, desce logo. Vamos acabar com isso de uma vez.
– Eu vou descer, mas não vou tomar vacina nenhuma.
Os dois ficaram parados na calçada. Da janela da clínica, as funcionárias assistiam a tudo de camarote – olhando umas para as outras e rindo baixinho.
– Dudu, filho, não me faz passar vergonha. Por favor, são cinco minutos e a gente vai embora.
– Eu não sou obrigado a tomar essa vacina, mãe! Não enche.
– Eu vou ter que chamar alguém lá dentro pra levar você arrastado? É isso o que você quer?
– Chama! Quero ver!
A mãe entrou na clínica. Voltou com dois funcionários – que não conseguiam parar de rir.
– Eles vão acompanhar você.
– Eles não podem me tocar! Vocês não podem me tocar! Eu vou chamar a polícia!
Se jogou no chão e ficou deitado na calçada. A mãe, com as duas mãos apoiadas no carro e olhos fechados, sem saber o que fazer.
– Podem buscar a vacina, ele vai tomar aqui mesmo.
– Não!
– Vai tomar aqui mesmo, chega dessa palhaçada. Que vergonha!
– Mãe, por favor, mãe! Por favor, não!
Começou a chorar e gritar.
– Dudu, olha pra mim. Você é um ser humano perfeitamente saudável, com uma vida maravilhosa, você levante desse chão agora e enfrente esse medo porque eu já tô perdendo a paciência.
– Mãe, eu não vou conseguir. Eu não tô preparado.
– Dudu, você tá. Chegou a hora.
– Ainda não, mãe, ano que vem eu tomo.
– Dudu, você tem 37 anos, puta que pariu! Levanta desse chão! O que sua esposa ia pensar se estivesse aqui?
– Tá bom, eu levanto. Não conta pra ela, por favor. Por favor!