Na sexta-feira passada, último encontro do Conversarte, um dos novos eventos culturais que surgiram e movimentaram Curitiba neste ano, descobrimos que Gustavo e Otávio Pandolfo, OSGEMEOS, só cogitariam uma única profissão que não fosse a atual: seriam bombeiros.
A fixação dos artistas era tanta que chegou uma idade em que os dois queriam passar o dia no quartel do Cambuci, bairro em que cresceram, em São Paulo.
Os pais dos meninos – que, pelo relato deles, eram os mais pacientes do mundo – levavam os filhos todos os sábados para almoçar com os bombeiros. Aliás, se não fosse assim, nem comiam.
Quem estava na plateia lotada, também ouviu que o estilista mineiro Ronaldo Fraga teve aulas de desenho com um professor que era carnavalesco de Belo Horizonte, que ele sempre lê dois livros ao mesmo tempo – uma biografia e “outra coisa qualquer” – e que não pensa muito na roupa que vai vestir antes de sair de casa. Apesar de todo o aparato tecnológico atual, também não dispensa o traço feito à mão.
Se não fosse uma iniciativa pessoal da jornalista Carolina Montenegro, talvez não teríamos o privilégio deste e de outros encontros que aconteceram nos meses passados, com nomes como Fernando Meirelles, Walter Firmo, entre outros.
A curitibana, que tem “sangue nordestino correndo nas veias”, foi influenciada e inspirada desde criança pela avó, Marlene Montenegro, que dirigiu várias instituições culturais da cidade. Mas partiu para a produção cultural de fato quando foi convidada, em 2007, para desenvolver os projetos culturais de reforma e programação anual dos teatros do Grupo Bom Jesus.
Mas sempre percebeu a cidade como um pólo cultural. “E muito se tem feito para que isso se mantenha. Hoje recebo convites de outros estados, como Rio Grande no Norte, Pernambuco e até São Paulo para levar o que fazemos aqui pra lá. Fico bem feliz com esse reconhecimento”.
Ela conversou com Escotilha sobre o Conversarte, que já tem segunda edição garantida para 2016: as linhas de abordagem serão música, dança, moda, literatura e teatro, e os encontros serão realizados nas salas de cinema do Cinemark Mueller.
Veja os principais trechos da entrevista:
O que a moveu a realizar o evento? Era algo que você sentia falta em Curitiba?
Curitiba é uma cidade que respira cultura. Festivais de teatro, cinema, música, bienais de artes visuais, entre outros preenchem a agenda daqueles que consomem arte. A proposta do Conversarte foi complementar a cena dando voz aos artistas, criando diálogos deles com suas plateias, proporcionando uma imersão em seus pensamentos criativos e estéticos.
O projeto é realizado via Leu Rouanet. Como é lidar com esses processos?
A Montenegro Produções Culturais trabalha com projetos incentivados há sete anos. O Conversarte foi o décimo sexto projeto executado nesse período. O processo de inscrição de projetos na Lei Roaunet é muito transparente, os técnicos do MinC (Ministério da Cultura) são bem acessíveis para qualquer dúvida que tenha no percurso. Fechar a triangulação de um projeto que fomente a cultura, democratize seu acesso e incentive a produção local talvez seja a fórmula de se fazer dar certo.
Algo mudou na sua visão, falando do apoio de empresas, patrocínios e até mesmo na viabilização de eventos?
A Montenegro, segundo dados do Ministério da Cultura, é uma das únicas produtoras do sul do país a ter seus projetos 100% incentivados. Esse é um caminho que conquistamos com projetos bem formatados que garantem qualidade em suas execuções. Como nossas propostas culturais fogem da perspectiva comercial, trabalhar com eventos culturais apostando em retorno de bilheteria é loucura. No mesmo sentido, a venda de patrocínio direto também é muito difícil de acontecer. Temos ciência de que as leis de incentivo contribuem em grande parte para o desenvolvimento cultural do país. O que falta é capacitação do mercado para que entendam o mecanismo. Muitos gestores de grandes empresas ainda têm uma ideia bastaste equivocada sobre projetos incentivados.
Como nossas propostas culturais fogem da perspectiva comercial, trabalhar com eventos culturais apostando em retorno de bilheteria é loucura.
Como funcionou a escolha de todos os convidados e artistas?
Primeiro, definimos as linhas centrais da programação nesse ano: ilustração, fotografia, cinema, artes visuais e grafite. Depois, nossa curadoria inicia a pesquisa de nomes que respondam aos princípios de: reconhecimento de público, contribuição para o desenvolvimento da cultura brasileira e inovação.
O último encontro foi super disputado. Como recebeu isso?
A negociação com OSGEMEOS foi a mais longa. Foram seis meses de ajustes até que o contrato pudesse ser formalizado. Foi o último evento justamente por saber que seria o mais concorrido. Nós tínhamos essa ideia logo que lançamos a programação. Sabíamos que o público do grafite é forte na cidade e que eles esperavam por esse contato com a dupla. Unir a arte de rua com a moda foi a maneira que encontramos de mostrar a convergência dessas manifestações e isso foi percebido e bem aceito pela plateia. De todos os cinco encontros, esse último foi o de maior número de pessoas.
![A plateia lotada do último encontro do Conversarte](https://escotilha.com.br/wp-content/uploads/2015/12/artes-visuais-conversarte-publico.jpeg)
Muito se falava que o curitibano não saía de casa. Hoje notamos o contrário, com ruas cheias, e eventos públicos e privados muito bem recebidos. Como você analisa isso?
A cidade de Curitiba tem muitas opções culturais. Tem atração de segunda a segunda para todos os gostos e bolsos. Não acredito nesse perfil do curitibano que não sai de casa. Hoje, o desafio para os produtores culturais é ser relevante, é ter conteúdo e assim atrair a atenção do público para o seu evento.
Qual o seu desejo para Curitiba, culturalmente falando? Tem algo que sonha em ver acontecer?
Meu desejo é que a produção cultural de Curitiba seja vista e reconhecida pelos curitibanos. Na produção observamos muito esse contraste: estamos na cena, mas nossos artistas não. Existem movimentos claros de incentivo a produção local, mas ao curitibano falta ainda essa percepção de valorizar o que é nosso.
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