Um artigo do jornal The Guardian publicado na semana passada tem provocado polêmica entre fãs e pesquisadores do horror. O texto assinado pelo jornalista Steve Rose defende que há uma onda de novos filmes que desafiam as convenções do gênero e frustram as expectativas do público ao privilegiar temas mais sombrios aos sustos fáceis. Esse movimento é denominado pelo crítico de pós-horror.
Nomearmos um grupo de obras de ‘pós-horror’ não parece negar a pluralidade do horror nem precisa ser um elemento que a coloque acima de outros títulos.
Na perspectiva de Rose, obras como o recente Ao Cair da Noite (2017), de Trey Edward Shults, e o renomado A Bruxa (2015), de Robert Eggers, são exemplos dessa tendência. Ambos foram duramente criticados por uma parcela dos espectadores que, ao não encontrarem as reações emocionais de sempre durante a projeção, se apressaram em taxar as obras como um engodo sem graça e não como legítimos produtos de horror.
A Ghost Story (2017), dirigido por David Lowery e ainda sem previsão de estreia no Brasil, também foi citado como parte do movimento. A produtora A24, que responde pelas três produções, chegou a tuitar sobre o tema, negando que o título seja uma narrativa de horror ou pós-horror. “[O filme] é uma história de amor sobre o tempo e a enormidade de nossa existência”, escreveram na rede social, sem esclarecer muito ao público.
PSA: #AGhostStory is not a horror movie. It’s not a ‘post-horror’ movie. It’s a cosmic love story about TIME and the enormity our existence.
— A24 (@A24) July 6, 2017
Entre os fãs e pesquisadores do gênero, a proposta de Rose tem rendido calorosos debates. Nia Edwards-Behi, do site Warped Perspective, acusou o jornalista do The Guardian de não conhecer o horror e de limitá-lo como rígido. O site Cyber Craft Video disse que o pós-horror é um rótulo elitista, que ignora o potencial do gênero. Em seu canal no YouTube, o pesquisador Ryan Hollinger conclui que o termo não muda a essência do horror de forma objetiva.
Pessoalmente, acho a discussão toda interessante, especialmente porque nos leva a refletir sobre a própria definição de horror. Em A Filosofia do Horror ou Paradoxos do Coração, obra de Nöel Carroll que cito frequentemente nesta coluna, o gênero é descrito como uma forma narrativa que depende de uma resposta emocional do público.
No senso comum, tendemos a imaginar que essa reação seja o medo. O autor, no entanto, propõe que ela é uma mistura de repulsa e ameaça, provocada por um elemento comum – o monstro (que, às vezes, precisa ser dimensionado como uma abstração). Essa proposta de classificação de Carroll é ampla o bastante para caber todos os tipos de histórias e olhares, nem sempre ao gosto preferencial do grande público.
Nomearmos um grupo de obras de “pós-horror” não parece negar essa pluralidade do horror nem precisa ser um elemento que a coloque acima de outros títulos. Pode, por outro lado, servir como uma maneira de marcar um novo ciclo de consumo, como fez o escritor Jason Zinoman ao chamar de new horror a geração de John Carpenter, Wes Craven e Tobe Hopper em seu livro Shock Value: How a Few Eccentric Outsiders Gave Us Nightmares, Conquered Hollywood, and Inven ted Modern Horror.