Em 2017, Com Amor, Van Gogh ganhou fama planetária. O mundo surpreendeu-se com um filme nunca antes feito na história do cinema, dirigido por Dorota Kobiela e Hugh Welchman. Era um trabalho todo produzido com pinturas a óleo e que retratava, com toques de ficção, a vida do pintor holandês famoso por seus quadros coloridos, a incompreensão, o fracasso em quatro profissões antes de começar a pintar aos 29 anos e o corte da própria orelha. O projeto era tão arrojado que mereceu um documentário revelando detalhes do processo de criação. Com Amor, Van Gogh: O Sonho Impossível (2019), é dirigido por Miki Wecel e conta, em 60 minutos, como foi essa saga.
O documentário começa com a idealizadora de Com Amor, Van Gogh, Dorota Kobiela, falando para um grupo de pessoas sobre o quão ousado e arriscado era o projeto: os envolvidos eram da Polônia, um país completamente à margem dos grandes estúdios; a diretora era desconhecida do meio cinematográfico mundial; a equipe prestes a fazer um trabalho de animação não era composta por animadores profissionais; e o que estava por vir era algo que a própria grande indústria do cinema nunca tentou. Ao fim dessas palavras, Dorota ganha aplausos do grupo que a ouve.
É nesse clima de comemoração que o documentário começa. Ao se verificar as minúcias de como o filme de 2017 saiu da mente de sua idealizadora até desembocar em uma indicação ao Oscar de melhor animação em 2018, é coerente mesmo considerar que tudo é muito digno de comemoração. Além das dificuldades iniciais já expostas por Dorota Kobiela no início do documentário, foram vários os desafios técnicos e financeiros que vieram depois.
Inicialmente, seria um curta de animação de sete minutos, que passou para um longa de 80 minutos. Para ampliar a duração sem comprometer a qualidade do conteúdo, Dorota afirma ter comprado e lido o maior número possível de livros com orientações sobre elaboração de roteiro. Depois, veio a necessidade de adaptação do ambiente de trabalho para aumentar a produtividade dos artistas envolvidos, de modo a reduzir o tempo de produção de uma tela, por exemplo, de três horas para uma hora e meia.
As cenas eram gravadas com atores reais e, depois, transpostas para as pinturas a óleo, que foram feitas somente após cuidadosa seleção da melhor tinta. Os quadros de Van Gogh tinham formatos diferentes, mas geralmente, uma forma mais quadrada. Tudo precisou ser adaptado para preencher o formato da tela de cinema, mais retangular. Dessa forma, não raras vezes os integrantes da equipe de criação precisavam complementar, pintar detalhes extras nas laterais.
O documentário, originalmente feito para a televisão, é bem convencional, composto por uma série de entrevistas com os envolvidos no projeto de criação de Com Amor, Van Gogh.
Foram produzidas 157 pinturas-guias, que serviam de orientação para todos os artistas envolvidos e tinham o objetivo de manter a coerência e a consistência nos traços e na combinação dos tons. Enquanto os pintores distribuíam cores e formas nas telas, era preciso batalhar em busca de financiamento, elaboração de treinamento, contratação de mais profissionais. Ao todo, foram produzidas 65 mil pinturas. Os idealizadores realizaram testes com mais de 500 pintores até chegarem a uma equipe de cem deles trabalhando. O projeto chegou a contar com três estúdios em dois países.
Em uma das cenas do documentário, a equipe do filme é ovacionada pelo público que, em pé, aplaude intensamente por doze minutos. Era o término da primeira exibição do trabalho. A diretora, então, afirma que gostaria muito que o próprio Van Gogh, um dia, pudesse ter recebido todo esse carinho. “Talvez ele tivesse vivido um pouco mais”, expõe Dorota. É bem conhecida a história de que o artista foi bastante incompreendido pelas pessoas ao seu redor; tanto que, em vida, vendeu apenas um quadro.
O documentário termina com a música “Starry, Starry Night”, de Don McLean, que complementa essa declaração de amor ao pintor holandês. Alguns dos versos apontam: “Eu poderia ter dito a você, Vincent: esse mundo não foi feito para alguém tão lindo como você”. Por fim, um detalhe curioso, mas que dá uma ideia do sentimento que, em meio aos imensos desafios, permeou o processo de concretização de Com Amor, Van Gogh: os diretores, Dorota Kobiela e Hugh Welchman, se apaixonaram durante a elaboração do filme. Não apenas pelo projeto em si, mas, também, um pelo outro.
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