A sequência de Estômago, intitulada O Poderoso Chef, não esconde sua inspiração no famoso clássico de Francis Ford Coppola, sugerindo desde o subtítulo a sua essência: é um filme de gângster. Em Estômago 2, o cineasta curitibano Marcos Jorge nos traz de volta Alecrim, o personagem vivido por João Miguel, que conquistou um lugar de destaque na prisão graças às suas habilidades culinárias. Agora, porém, o personagem se vê diante de um novo desafio: enfrentar um chefão mafioso italiano, que foi preso no Brasil junto com sua famiglia, e vai disputar o controle do presídio com o personagem Etcétera, interpretado por um um impagável Paulo Miklos.
O filme é uma coprodução entre Brasil e Itália que pretende unir dois mundos criminosos, com a gastronomia como elo central. A ligação com o primeiro filme é evidente: Raimundo Nonato, que posteriormente adotou o apelido de Alecrim, já havia introduzido seus colegas de cela ao universo dos sabores requintados, como o gorgonzola, o renomado queijo azul italiano.
Marcos Jorge preserva a complexidade narrativa que marcou o primeiro Estômago, um dos filmes brasileiros mais cultuados deste século. No original, vimos Alecrim ganhando espaço na prisão por seu talento culinário; nesta sequência, ele continua cumprindo sua pena, agora sob o comando de Etcétera, após a morte do antigo líder, interpretado por Babu Santana, vítima de indigestão.
A chegada de novos prisioneiros importantes, como o suposto capo siciliano Benedetto Caroglio (Nicola Siri), inicia uma disputa de poder dentro da prisão. As duas tramas – a brasileira e a italiana – se entrelaçam com certa fluidez, embora essa narrativa transatlântica, por vezes, perca o fôlego, e fique um pouco à deriva. A estrutura do roteiro, premiado no Festival de Gramado, é sem dúvida engenhosa, instigante, embora o resultado final fique aquém de sua promessa.
O filme alterna entre cenários na Itália e no Brasil, distribuindo o tempo de tela de forma quase igual entre os dois idiomas. Essa escolha parece mirar um mercado internacional.
O filme alterna entre cenários na Itália e no Brasil, distribuindo o tempo de tela de forma quase igual entre os dois idiomas. Essa escolha parece mirar um mercado internacional, com as cenas italianas legendadas em português no Brasil. A meticulosidade no roteiro e na narrativa, assim como a qualidade das atuações e da produção como um todo, são notáveis e dignas de elogio.
Chama a atenção a presença reduzida de João Miguel, que foi a figura central no primeiro filme. Em Estômago 2, o ator assume um papel ainda de grande importância, porém algo coadjuvante a partir de certo momento, ainda que transborde carisma e picardia. Nicola Siri, com seu Roberto/ Don Caroglio, assume o comando da narrativa, o que não é necessariamente um problema. Há espaço para os dois.
Estômago 2 faz várias referências explícitas, sendo O Poderoso Chefão de Francis Ford Coppola a mais óbvia. mas também dialoga com o cinema de Martin Scorsese e com Gomorra, de Matteo Garrone, que explora os meandros da Camorra, organização criminosa napolitana.
Estômago 2 conquistou cinco Kikitos no 52º Festival de Gramado: melhor filme do Júri Popular, melhor ator (Nicola Siri e João Miguel), melhor roteiro, melhor trilha sonora e melhor direção de arte.
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