O maior trunfo de Homem-Aranha: De Volta ao Lar é não se levar tão a sério como filme de super-herói e buscar trazer à tona a humanidade do personagem criado por Stan Lee de forma quase ingênua. Vivido com desenvoltura pelo jovem ator britânico Tom Holland (revelado por O Impossível), Peter Parker agora tem apenas 15 anos e é um adolescente mergulhado em típicos dilemas da puberdade: ansioso, inseguro e estabanado, ele nem sabe ao certo o que fazer com os super poderes, adquiridos antes do início da trama, graças a uma picada aracnídea. Nessa instabilidade, reside boa parte do charme da superprodução, dirigida por Jon Watts, do assustador A Viatura (2015)
Se a trilogia estrelada por Tobey Maguire, dirigida por Sam Raimi, fez bastante sucesso na primeira década deste século, apesar de o terceiro episódio ter sido muito criticado por público e crítica, os dois longas-metragens de Mark Webb, protagonizados recentemente por Andrew Garfield, nunca decolaram de verdade, mesmo não tendo sido fracassos comerciais. Eram genéricos demais, desprovidos de personalidade. Ao ponto de quase ninguém se lembrar mais deles, o que deve ter acabado encorajando a Sony, agora em parceria com a Marvel, a investir em um segundo reboot da franquia em tão pouco tempo.
Com um roteiro espantosamente coeso, levando-se em conta que o script passou pelas mãos de seis autores diferentes, Homem-Aranha: De Volta ao Lar funciona porque aposta na leveza, sem abrir mão de dialogar com a contemporaneidade – seus personagens centrais são garotos e garotas que vivem pendurados no celular e nas redes sociais.
Quando começa o filme, Peter passa por uma espécie de treinamento, na melhor tradição da Jornada do Herói, monitorado à distância por seu mentor, Tony Stark (Robert Downey Jr.). O Homem de Ferro lhe dá de presente um uniforme high-tech, cheio de recursos de última geração, mas o impede de se envolver em missões mais perigosas, que vão além de pequenas encrencas de vizinhança no bairro do Queens, em Nova York, onde ele vive com sua tia May (Marisa Tomei, de O Lutador).
Quando começa o filme, Peter passa por uma espécie de treinamento, na melhor tradição da Jornada do Herói, monitorado à distância por seu mentor, Tony Stark (Robert Downey Jr.).
Quem monitora Peter, a mando de Stark, é Happy Hogan (o ator e diretor Jon Favreau), que na ausência de uma figura paterna, lhe impõe limites e não o poupa de broncas. Hesitante, e visivelmente inseguro, o protagonista comporta-se como um garoto comum – sua relação com Os Vingadores, dos quais ele poderá vir a fazer parte, é de fã, como se eles não fossem de verdade, e sim personagens ficcionais.
O filme de Watts investe na diversidade. O melhor amigo de Peter na escola, o hilariante Ned (Jacob Batalon), é de origem asiática e obeso. Na trama inexiste a mocinha anglo-saxã Mary Jane. O aspirante a herói suspira por uma colega, Liz (Laura Harner), afrodescendente e integrante do time dos nerds que disputa competições científicas, do qual Parker e Ned fazem parte. Mas a verdadeira protagonista é Michelle, vivida pela estrela teen Zendaya, também negra. No futuro, há indícios de que, possivelmente, ela irá disputar o coração de Peter.
Mas e o vilão? Embora as cenas de ação, um tanto protocolares, não sejam exatamente o ponto forte de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, Michael Keaton brilha no papel de Adrian Toomes, o dono de uma empresa de reciclagem de detritos extraterrestres que utiliza peças de naves alienígenas para se transformar no Vulture (Abutre), o antagonista alado do filme, que faz lembrar outros personagens de Keaton, como Batman, mas, principalmente, o alter ego do protagonista de Birdman, vencedor do Oscar de melhor filme que ressuscitou sua carreira cambaleante.
Com mais acertos do que erros, Homem-Aranha: De Volta ao Lar, se não chega a ser sensacional, acerta em cheio ao apostar em Holland, cujas habilidades de ginasta e dançarino foram fundamentais para sua escolha para o papel. Longe de ser um galã, ele tem um tipo comum mas carismático, e aparenta bem menos do que seus 20 anos durante as filmagens. Convence, portanto, como um adolescente que se torna herói meio ao acaso, é relutante, e, embora corajoso, tem tanto medo de enfrentar vilões armados até os dentes quanto uma bronca de sua tia May.
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