No jargão do cinema norte-americano, existe um determinado tipo de roteiro que recebe a alcunha de “história sobre um peixe fora d’água”. Como Hollywood adora enredos que envolvam indivíduos que, mergulhados em algum tipo de ostracismo, conseguem encontrar seu lugar no mundo sem se trair, mas por meio de alguma espécie de redenção, exemplos não faltam. Entre os bem-sucedidos, que não são muitos por se tratar de um clichê que muitas vezes não ultrapassa os limites do lugar comum, um dos mais interessantes é a comédia dramática Hora de Voltar, que, 15 anos após seu lançamento, ganhou aura de obra icônica sobre a juvantude do início dos anos 2000.
Primeiro trabalho como diretor do ator Zach Braff, até hoje mais conhecido no Brasil pela série médica cômica Scrubs, o filme consegue apropriar-se de uma fórmula batida, reinventá-la e até acrescentar uma generosa dose de originalidade.
O próprio Braff vive o protagonista, Andrew Largeman, um jovem ator que sobrevive em Los Angeles graças a bicos. A história tem início quando o personagem retorna à casa paterna para enterrar a mãe. Em estado de imobilidade emocional desde os 9 anos, quando teria provocado um acidente que deixou sua genitora paralítica, o rapaz encontra no funeral e nos dias que sucedem o evento uma oportunidade de ajustar as contas com o passado, o pai psicanalista (Ian Holm) e consigo mesmo.
O próprio Braff vive o protagonista, Andrew Largeman, um jovem ator que sobrevive em Los Angeles graças a bicos.
Durante a estada numa pequena comunidade-dormitório de Nova Jersey (o Garden State que dá título original à produção), Andrew reencontra um amigo de infância (o ótimo Peter Saarsgard, de Educação), afundado na letargia e na maconha, e conhece Sam (Natalie Portman, de Cisne Negro), garota que lhe serve como uma espécie de mentora em sua jornada de volta a si mesmo. A personagem, no entanto, está longe de ser uma “mocinha” convencional. Ela é tão excêntrica e atormentada quanto Andrew. Juntos, eles vão tentar encontrar um sentido na vida. O resultado dessa busca é sublime, em alguns momentos, para o espectador.
Bons diálogos, personagens complexos e multifacetados, situações inusitadamente líricas, engraçadas e surpreendentes, sem falar de uma trilha sonora inspirada (composta de canções do indie rock anglo-saxão), fazem de Hora de Voltar uma surpresa muito agradável.
É uma daquelas histórias de amor que não subestimam a inteligência do espectador, divertindo e enlevando sem tirar-lhe o prazer de fazer pensar.
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