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A Cinemateca de Curitiba e os filmes que nunca terminam

Desde 1975, a Cinemateca de Curitiba é espaço vital para o cinema, a formação de cineastas e o diálogo cultural na cidade. Meio século iluminando histórias, imagens e olhares que transformam.

porPaulo Camargo
28 de maio de 2025
em Cinema
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Espaço antigo da Cinemateca de Curitiba, hoje Casa da Memória. Imagem: Marcos Campos / Acervo Casa da Memória / DPC / FCC / Reprodução.

Espaço antigo da Cinemateca de Curitiba, hoje Casa da Memória. Imagem: Marcos Campos / Acervo Casa da Memória / DPC / FCC / Reprodução.

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Curitiba guarda alguns de seus fantasmas em lugares improváveis. Lugares que, embora deslocados, transformados ou apagados fisicamente, continuam reverberando na memória de quem os viveu. Sempre que cruzo a Rua São Francisco, o Largo da Ordem, e passo pela Casa da Memória, me toma uma vertigem discreta, quase um tropeço no tempo. Porque é impossível não lembrar que ali funcionou, por quase duas décadas, a Cinemateca do Museu Guido Viaro.

Mais do que uma sala de cinema, aquele espaço era um território simbólico. Refúgio para quem entendia o cinema não como distração, mas como linguagem, pensamento, experiência estética e possibilidade de transformação.

A Cinemateca de Curitiba nasceu em 1975, obra do espírito inquieto de Valêncio Xavier — escritor, cineasta, montador, artista e arquiteto de afetos culturais. Desde sua origem, como equipamento da recém-criada Fundação Cultural de Curitiba, operou junto ao Museu Guido Viaro, no coração do Largo da Ordem. E desde sempre foi mais que uma sala de exibição: era um gesto de resistência. Num Brasil que atravessava os anos duros da ditadura, abrir janelas para outros olhares, outras narrativas e outros mundos era, sem dúvida, um ato político.

O prédio parecia modesto, quase invisível para quem passasse distraído. A sala de exibição era pequena, com pouco mais de sessenta lugares. Cadeiras desconfortáveis, tela modesta, nenhuma sofisticação técnica. Mas havia algo que nenhuma sala comercial podia oferecer: o senso de pertencimento, de comunhão, de partilha.

A experiência começava antes que as luzes se apagassem. A diminuta sala de espera, quase um corredor largo, funcionava como extensão da sala escura. Ali se davam as conversas, os encontros, as discussões acaloradas e, muitas vezes, as primeiras iniciações cinéfilas. Falava-se sobre Pasolini, sobre Glauber, sobre Bergman, sobre Tarkovski, Godard, Antonioni. Era uma escola sem grades, onde se aprendia a olhar — e a pensar — o cinema e o mundo.

As sessões lotavam. Gente sentada nas escadas, encostada nas portas, de pé nos fundos. As filas na calçada eram cena corriqueira. E havia uma solenidade silenciosa no ato de esperar por aquele filme raro, muitas vezes impossível de ser visto de outra forma.

As sessões lotavam. Gente sentada nas escadas, encostada nas portas, de pé nos fundos. As filas na calçada eram cena corriqueira. E havia uma solenidade silenciosa no ato de esperar por aquele filme raro, muitas vezes impossível de ser visto de outra forma.

Foi lá que assisti, pela primeira vez, a Teorema, de Pasolini — filme que me atravessou como poucos, deslocando certezas, embaralhando sentidos. Vi, em êxtase e perplexidade, Terra em Transe, de Glauber, que me ensinou que a montagem é um modo de pensar o Brasil. E mergulhei na angústia metafísica de Morangos Silvestres, de Bergman, durante uma mostra memorável dedicada ao cineasta sueco, que mobilizou filas homéricas, sessões esgotadas, público espremido — como quem sabe que não está apenas vendo um filme, mas atravessando um rito.

A Cinemateca de Curitiba formou uma geração inteira. Ali se forjaram olhares, sensibilidades e vocações. Fernando Severo, Berenice Mendes, Peter Lorenzo, Beto Carminatti, Rui Vezzaro, os Irmãos Wagner, e, mais tarde, Geraldo Pioli, Werner e Willy Schumann, entre outros — todos atravessados por aquela experiência. E não só cineastas. Também críticos, pesquisadores, técnicos, apaixonados pela linguagem. Gente movida pela convicção de que fazer cinema em Curitiba, no Paraná, no Brasil, era — e continua sendo — um ato de invenção e resistência.

No fim dos anos 1990, a Cinemateca deixa a sede do Largo da Ordem e se transfere, em 1998, para a Rua Carlos Cavalcanti, onde assume oficialmente o nome de Cinemateca de Curitiba. A mudança não foi apenas de endereço, mas de escala e de ambição. Consolidou-se como equipamento de referência da Fundação Cultural, com acervo ampliado, estrutura mais robusta e missão renovada.

Entre 1991 e 1994, vivi ali uma das experiências mais formadoras da minha vida. Trabalhei na Cinemateca ao lado de Francisco Nogueira, diretor sensível, e de Paulo Biscaia Filho, programador brilhante, cuja curadoria era, ao mesmo tempo, exercício de rigor e de poesia.

Ali aprendi que programar uma sala de cinema não é preencher uma grade. É criar discursos, provocar encontros, construir sentido coletivo. As conversas que aconteciam depois das sessões, que se estendiam pelo saguão, pela calçada, muitas vezes madrugada adentro, eram parte essencial daquela experiência.

O que fazia daquele espaço algo tão potente não era só a qualidade dos filmes exibidos. Era o fato de que a Cinemateca de Curitiba funcionava como um ecossistema afetivo e intelectual, onde circular ideias, debater e partilhar o encantamento diante das imagens era tão vital quanto o próprio ato de assistir.

Hoje, a Cinemateca de Curitiba ocupa outro espaço, cumpre outras funções, responde a outros desafios. Mas há coisas que o tempo não leva. Porque certos lugares não pertencem apenas ao espaço físico, mas à geografia íntima da memória — esse território onde o passado não é distante, mas presença constante.

Quando passo pelo antigo prédio da Cinemateca, hoje Casa da Memória, ainda ouço, no fundo da escuta, o som do projetor, o murmúrio das conversas, o ranger das cadeiras, os diálogos sussurrados em línguas diferentes, os aplausos tímidos, às vezes mais efusivos, ao final das sessões. Ainda sinto o cheiro das pastilhas de naftalina misturado ao mofo dos cartazes, ao perfume dos livros manuseados, à eletricidade da expectativa antes que as luzes se apaguem.

A sala escura da memória não se apaga. Porque há filmes, há encontros e há espaços que nunca terminam.

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Tags: CinemaCinemateca de CuritibaFundação Cultural de Curitiba

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