Cair é duro. Duro como o asfalto, que além de sólido é áspero e austero.
Ainda assim, não há skatista de verdade que tenha desistido após sentir os seus efeitos.
Mesmo que haja ralados, sangramentos, ossos ou dentes quebrados, todos se levantam para novamente desafiar o piso sólido e sentir o prazer do vento.
Mas ainda que caia sozinho, o skatista sempre tem uma mão disposta a ajudá-lo.
A importância da união no ato de cair e se erguer é o tema do documentário Dirty Money – Uma geração que transformou o skate no Brasil.
No entanto, ainda que ir ao chão e erguer-se seja representativo na prática do skateboarding, o videodocumentário vai muito além ao mostrar que isso não foi apenas um símbolo para um grupo de skatistas que se viu desamparado quando o Plano Collor entrou em vigor. Sem patrocínio e vendo o sonho de ser profissional cada vez mais distante, foi preciso declarar independência e, para manter o esporte vivo, aprender a caminhar com as próprias pernas.
Para isso, André Qui, Ale Ribeiro, Alexandre Vianna, Bob Burnquist, Cesar Lost, Charles Chaves, Cristiano Testa, David Toledo, Eduardo Du, Fábio Cristiano, Márcio Tarobinha, Nilton Urina, Robson Reco e Rogério Mancha tiveram que ir além do óbvio e decidiram realizar uma produção independente.
Intitulado Dirty Money, o videotape em questão foi gravado com uma câmera em formato vídeo 8 e editado de um videocassete para outro. O resultado rodou o Brasil e fez com que mais e mais pessoas se sentissem encorajadas mesmo em um período financeiramente ruim.
Prestando um justo reconhecimento a essa geração e sua obra, o documentário lançado em 2010 parte de um contexto histórico, relatando a febre do skate no Brasil. Com o fim da ditadura militar o esporte se espalhou rapidamente, unindo cultura urbana, diversão, competição, amizade, estilo de vida e a vontade da descoberta.
Os campeonatos tinham as piores infraestruturas possíveis. As peças eram usadas até o limite do possível. As revistas e os patrocinadores sumiram. Restou só o sonho.
Contando com três revistas dedicadas ao gênero e um programa televisivo, tudo levava a crer que a modalidade ia longe. E foi. Em 1989, uma delegação brasileira chegou à Alemanha e voltou do campeonato mundial com a conquista do quarto lugar, vencido por Lincoln Ueda.
Um ano depois, no entanto, o skate quebrou.
Os campeonatos tinham as piores infraestruturas possíveis. As peças eram usadas até o limite do possível. As revistas e os patrocinadores sumiram.
Restou só o sonho.
E se a iniciativa privada os deixou na rua foi da rua que renasceram.
Com um foco direcionado para a modalidade street e acompanhando as fitas americanas, o grupo remanescente decidiu criar a sua própria obra. De maneira totalmente artesanal, Dirty Money colocou em cena a ideia de que era possível progredir.
O progresso, então, veio com a divulgação do vídeo, uma marca de roupas com o mesmo nome e uma reportagem na Rede Globo que originou uma segunda produção.
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Depois, passado o período de instabilidade, muitos dos integrantes do grupo se tornaram profissionais, conquistaram patrocínios e reconhecimento não apenas no Brasil, mas também nos Estados Unidos e Europa.
Para mostrar o caminho percorrido por eles até chegar à conquista do mundo, o documentário dirigido por Alexandre Vianna, um dos responsáveis pelo Dirty Money original, e Ricardo Koraicho traz entrevistas acompanhadas de uma narração que dá um tom épico à história. Assim, invés de fazer com que os entrevistados contem tudo detalhadamente, a voz em off resume boa parte dos acontecimentos e deixa para que os envolvidos falem somente aquilo que realmente importa. O resultado é um vídeo dinâmico que faz com que em pouco mais de 45 minutos seja conhecida essa importante memória do skate brasileiro. Vale destaque ainda o fato de o documentário não só falar do tape que causou toda a revolução, mas também incluir trechos consideráveis do mesmo.
Além disso, o grande ganho do documentário é lembrar que quem faz o skate não são as marcas, mas sim os skatistas.