Andei sumida deste espaço. Todos aqui de casa passamos por algumas semanas de adaptação depois da chegada da caçula e os ponteiros do relógio avançaram em ritmo acelerado, sem dó, nem piedade, sem tempo, nem energia para as tarefas que exigem esforço mental, como sentar na frente do computador e escrever. É o que sempre acontece com a chegada de um bebê, é como conhecer alguém ou fazer um novo amigo: a gente começa devagar, mas depois pega intimidade.
Essa coluna semanal começou com o intuito de tratar dos temas relativos à maternidade e dar vazão a uma premissa que vivencio desde a chegada da minha primeira filhota: de que ter filhos pode ser suave, embora haja sacrifícios diários. Nossa intenção sempre foi criar uma rotina que respeitasse a maioria dos moradores da casa, levando em conta que a criança é a parte mais frágil dessa relação, mas sem deixar de lado a “humanidade” dos pais. Ou seja: criamos com amor, carinho e paciência tanto quanto seja possível. Mas queremos manter na agenda aquilo que gostamos e nos faz bem: encontrar os amigos, sair para passear, viajar, praticar exercícios físicos, ler, assistir a filmes.
Eu tinha pavor de ter filhos, porque o que mais ouvia eram terríveis relatos de como aquelas pequenas criaturas poderiam transformar a vida de qualquer adulto saudável num inferno sem precedentes que envolvia fraldas sujas, desenhos infantis irritantes e nenhuma vida social. Tive uma agradável surpresa quando minha primogênita chegou e vi que ter filhos é intenso, maravilhoso, enriquecedor. Trabalhoso e cansativo também, mas jamais limitante ou o “fim da linha”.
Nessa semana, vi pipocar por aí, nas timelines alheias, a afirmativa de um pesquisador (psicólogo de Harvard, saca só a importância do cara) de que os filhos trazem felicidade aos pais, porque acabam sendo a única alternativa de felicidade. Segundo ele, depois de ter filhos, as pessoas não têm mais amigos, param de fazer sexo ou ir a concertos. Logo, a única alegria da vida são os filhos, pois não haveria mais nada.
A pesquisa dele é interessante sob vários aspectos, mas não se enganem, há vida depois dos filhos. A maioria dos pais que conheço continua levando em frente seus trabalhos, hobbies e vida social. Eu também. É claro que com adaptações, principalmente no período (curto) da vida no qual os filhos dependem mais de nós: quando são bem pequenos.
É uma escolha a se fazer: equilibrar suas vontades com as necessidades da criança, adaptar, negociar e inclusive, se livrar do egoísmo disfarçado de liberdade que está presente na falsa máxima: “faço o que quero na hora que quero”. Como vivemos em sociedade, ninguém faz o que o quer na hora que quer, até quem não tem filhos.
Tirar as crianças de casa é um dos pequenos passos no caminho que temos de percorrer para ensiná-las a conviver em sociedade.
Se eu já estava escolada nisso com uma filha só, agora me sinto apta a dizer que isso continua sendo verdade quando se tem duas. Passado o tempo necessário para se adaptar e conhecer o novo membro da família, até já nos aventuramos em um destino pouco provável: Ilha do Mel com dois bebês (uma de 1 ano e 11 meses e outra com 2 meses e meio).
Para quem não conhece, a Ilha do Mel fica no litoral paranaense e visitá-la exige certo desprendimento: é preciso deixar o carro num estacionamento e fazer a travessia de barco, parar em um trapiche e percorrer a pé o trecho até o destino desejado. Fomos de mala, cuia, carrinho de bebê, mochilas e crianças a tiracolo. Dessa vez, contamos com a ajuda de familiares que também fizeram a viagem.
Diferente das vezes que fomos à Ilha sem filhos, dessa vez não fizemos longos percursos andando entre as trilhas e praias. Escolhemos uma casa perto da praia e ficamos por ali mesmo, fazendo trajetos mais curtos e deixando tempo e espaço para as sonecas das pequenas. Toda a família aproveitou o passeio. Areia dá gastura, mas com criança vale a pena porque a felicidade dos bichinhos com areia e água é ímpar nesse mundo. Sol faz bem, maresia destranca narizinhos afetados com a chegada do outono.
É claro que sair da rotina com crianças pode ser cansativo, mas espairecer e mudar de ares compensa o esforço. A experiência é positiva também para as crianças. A mais velha conviveu com avós, tios e primos e brincou em lugares diferentes. A mais nova é tão nova… (risos). Elas não se lembrarão desta experiência especificamente, mas acredito que tirar as crianças de casa é um dos pequenos passos no caminho que temos de percorrer para ensiná-las a conviver em sociedade.
Em uma das trilhas, com uma filha em um braço e a mochila no outro, parei um pouco para descansar e ver a paisagem do sol do fim de tarde perto da praia. Duas moças bem jovens estavam por perto fotografando o momento e ouvi comentarem entre si, quase como um apelo e um recado para o futuro: “olha, com criança no colo não dá para mexer no celular”. Quis rir junto, mas me resta concordar: realmente, às vezes não dá. Perdi de fazer uma foto que ficaria ótima para o Instagram, mas por que é mesmo que isso importa tanto?
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