Era uma sexta. Final de campeonato. A Chandon gelava no isopor azul que, dias antes, havia mantido a picanha sob resfriamento. O campinho estava lotado. As pessoas tentavam disfarçar, mas aquele dia era especial. Único.
A equipe entra de mãos dadas pela lateral direita do terrão, logo ao lado do banco de reservas improvisado com assentos de couro de alpaca na noite anterior. Vestidos com o manto sagrado do time dos Jardins, zona oeste da capital paulista, levam o público ao delírio. É pura euforia. Na arquibancada, rostos ilustres se perdem em um mar de gente, embasbacada com a presença de inúmeros craques da futepolítica nacional.
As equipes se posicionam. Impossível não gravar o momento. Todos de verde e amarelo, contrastando com o chão de um vermelho barro inesquecível. Toca o hino nacional. As pessoas choram. Algumas pela emoção, outras por não saberem cantar o hino. O elenco e sua escalação memorável: no gol, o deputado Fernando Capez, o “Merendinha”; completam a defesa: Carlos Sampaio, Marco Tebaldi, Jayme Campos e Fraga, o “Armado”; no meio, Coronel Telhada, Romero Jucá, Marta “A Infiel” Suplicy e Rodrigo de Grandis, o “Engavetador”; no comando do ataque, Aécio “Inaceitável” Neves e José Serra.
O juiz Sérgio Moro soa o apito. A partida é parelha. Logo o time dos Jardins toma um gol. Da euforia à depressão. O treinador Michel Temer, procurando dar mobilidade ao time, troca Marco Tebaldi por Eduardo Cunha. As coisas passam a fluir. A equipe se organiza e passa a bloquear toda tentativa da equipe adversária em dar andamento ao jogo, enquanto Cunha auxilia na distribuição de jogadas pelo centro, sempre nas costas da defesa adversária.
Cunha auxilia na distribuição de jogadas pelo centro, sempre nas costas da defesa adversária.
Em jogada de contra-ataque, a equipe tucana empata. Marta fez o corta-luz e Rodrigo de Grandis meteu na gaveta. Um a um. A torcida inflama em hora crucial, porém, o jogo fica morno. Até que, em jogada genial de Cunha, aos 45 minutos do segundo tempo, José Serra é derrubado na área. Moro marca pênalti.
Tensão. Angústia. A torcida infla o pato de borracha na arquibancada dos Três Poderes. Bandeiras tremulam e um grito contínuo, ainda que contido, toma conta do campinho. “A nossa bandeira, jamais será vermelha!”, grita em uníssono a torcida. Serra pega a bola e a coloca debaixo do braço. Calmamente ele se encaminha para a marca da cal. Discute com Aécio que também quer cobrar o pênalti, mas desiste ao ganhar uma sonora vaia da torcida.
Agora é Serra e o goleiro. Parece que é possível ouvir o estômago das crianças sem merenda nas escolas de São Paulo. Serra olha confiante. Faz o sinal da cruz três vezes e corre. Goleiro num canto, bola no outro. O Jardins explode. Em Higienópolis, a torcida bate panelas e aplaude a TV. A comoção é generalizada. Serra tira a camisa, sobe no alambrado, grita feito um louco. É gol! É gol! É gol! A torcida do time adversário pede ao árbitro que dê cartão ao jogador por tirar o uniforme, porém, a equipe de arbitragem faz que não viu.
O juiz apita. Acabou. A torcida invade o gramado do acanhado, mas luxuoso, estádio da zona oeste paulista e carrega José Serra nos ombros. Com isso, ele vai às lágrimas. O próprio narrador se emociona. As câmeras focam apenas em seu sorriso maroto, um pouco contido, mas com dificuldades de disfarçar a felicidade. Depois de 13 anos, finalmente os tucanos venceram uma. Entrou para a história.