Sentado a uma mesa ou a um balcão de bar, diante de um copo de cerveja meio cheio, ele olha ao redor, e se percebe irremediavelmente sozinho. Não há muita gente, mas apenas ele bebe sem companhia. É a oportunidade para observar como os outros agem, e de que forma o enxergam: não são poucos os que, com o canto dos olhos, param um segundo ou dois para observá-lo, talvez se perguntando se está triste, afogando na cevada as suas mágoas, se espera alguém, que talvez esteja para chegar, ou nunca dê o ar de sua graça. Há inquietude diante de quem está só. É inevitável.
Estar ali, sem ninguém com quem partilhar aquela cerveja, representa um desafio, pois questiona um conceito de felicidade elaborado em torno do ideal socializante: indivíduos que, por opção ou força das circunstâncias, estejam bebendo desacompanhados, voando solo, devem, de acordo com um redutor senso comum, estar em rota de colisão consigo mesmos – e, se forem mulheres, os pré-julgamentos são ainda mais perversos. São muitas vezes vistos como portadores de algum tipo de inabilidade: alguém, para se sentir pleno, parece ter de provar ao mundo que é um ser sociável, popular. Há algo de cruel, e inexato nessa concepção.
“Há inquietude diante de quem está só. É inevitável.”
Para início de conversa, beber cerveja acompanhado de gente o tempo todo não blinda ninguém contra a solidão. Pelo contrário, pode significar justamente a tentativa dela se esconder, denunciando a dificuldade de lidar com a quietude da própria existência, e seus inevitáveis revezes. O silêncio, para alguns, pode ser mesmo insuportável, e disfarçá-lo, mesclando-se a outras solidões, é uma estratégia de autoengano apaziguadora.
Ele, que sente prazer ao escolher uma mesa, sentar-se sem pressa, e pedir uma cerveja, e dali olhar para o mundo, pode estar em busca de coisa alguma, apenas de alguns momentos consigo mesmo. Não é avesso a nada ou a ninguém, e, é possível, talvez busque se compreender um pouco melhor, ainda que de um ponto de vista todo seu. Pode (ou não) estar brindando, sem alarde, uma conquista que, naquele instante, é uma escolha sua. O triunfo de beber a vida sem pressa. Gole a gole.