Há pouco mais de três semanas, me mudei para um edifício de traços modernistas construído no inicio dos anos 1960 no Centro de Curitiba. Estou escrevendo este texto a três quadras do prédio histórico da Universidade Federal do Paraná, onde estudei por seis anos e me formei no início da década de 1990, e do Teatro Guaíra, espaço cultural que me proporcionou algumas das experiências estéticas mais fundamentais de minha vida. Em seu palco, assisti a Elis Regina no antológico show “Transversal do Tempo”, à montagem original do musical Ópera do Malandro, de Chico Buarque, que também lá vi pela primeira vez, na turnê do maravilhoso álbum Paratodos. Sinto que estou onde deveria e quero estar.
Mas viver na região central de uma grande cidade do Brasil em 2019 é, também, encarar de frente a realidade de um país empobrecido. Há muito tempo, nem sei quanto, não percebia Curitiba tão desvalida, com tantos miseráveis espalhados por todo canto, e isso é ainda mais evidente quando se trata de uma localidade que se percebe, equivocadamente, como exceção. Não é.
No último sábado, bem cedo pela manhã, testemunhei uma cena triste: um guarda municipal tentava convencer um homem negro de uns 40, 50 anos, a deixar a entrada do Auditório Salvador de Ferrante, o Guairinha, onde havia provavelmente dormido. Já passava das 8 horas e o sem-teto recusava-se a sair, enquanto o policial lhe dizia que não desejava tomar medidas mais drásticas: “Se o senhor sair, não vai acontecer nada.” Ele estaria, pelo que entendi da conversa, enfeiando a paisagem. Ainda que sonolento, perturbava a ordem.
Mas viver na região central de uma grande cidade do Brasil em 2019 é, também, encarar de frente a realidade de um país empobrecido. Há muito tempo, nem sei quanto, não percebia Curitiba tão desvalida, com tantos miseráveis espalhados por todo canto, e isso é ainda mais evidente quando se trata de uma localidade que se percebe, equivocadamente, como exceção.
Quando voltei pelo mesmo caminho, dez, 15 minutos mais tarde, nem ele nem o guarda estavam mais lá, porém havia pelo menos mais uma dezena de pessoas na mesmíssimo situação, espalhadas num raio de poucas quadras, pedindo esmolas, e de alguma forma cumprindo o importante papel de nos lembrar de quem somos e de onde estamos. Pode-se até tentar higienizar cosmeticamente uma cidade, porém é impossível varrer suas entranhas para baixo do tapete.