Todos os meses são janeiro para P.. Formado em Direito, o ex-funcionário público argentino, natural da sisuda Córdoba, começou a abandonar Buenos Aires quando colocou os pés pela primeira vez em Maragogi, pequena cidade no litoral norte do estado de Alagoas, onde as praias são de um verde esmeralda tão hipnótico que é quase impossível não compreender a decisão de trocar o estresse de terno e gravata pela tranquilidade de pés de descalços e bermuda.
Alguma coisa aconteceu no coração de P., mas não foi nessa primeira visita que ele resolveu mudar definitivamente de endereço. Hesitou, digladiou-se com seus desejos mais íntimos. Nômade, já havia morado na Alemanha e na França: o espírito andarilho que o trouxe ao Nordeste do Brasil poderia acabar o levando a outros destinos. Já era homem feito, na casa dos 30 anos, e precisava tomar juízo. Fez até um mestrado para negociar com a vida adulta, na busca por estabilidade.
Todos os meses são janeiro para P.. Formado em Direito, o ex-funcionário público argentino, natural da sisuda Córdoba, começou a abandonar Buenos Aires quando colocou os pés pela primeira vez em Maragogi.
Maragogi, no entanto, seguiu ecoando no coração de P.. Suas ondas, coladas nas retinas do inconsciente do gringo o transportavam da cosmopolita capital argentina, em devaneios, às piscinas de corais, às águas cristalinas de ondas sutis, por vezes quase imperceptíveis, e tão quentes que aquecem o mais racional dos mortais. Ele necessitava, portanto, retornar mais uma vez às Alagoas para ter absoluta certeza de que a cidadezinha não era mesmo seu lugar no mundo. Enganou-se – o canto da sereia azul turquesa foi irresistível e a saída mais digna foi ligar para a mãe e dar-lhe a notícia de que não voltaria mais.
O futuro seguro e promissor como advogado, servidor público, dissolveu-se em pouco tempo. P. optou pela mudança radical de rumo, e tomou nas mãos o leme de sua vida e zarpou em outra direção.
A barba por fazer, castanha escura, cobre metade do rosto, muito bronzeado, e iluminado por olhos também marrons e muito inquietos quando falam de seu paraíso particular, e de sua odisseia transformadora. Conta essas aventuras com um brilho que rivaliza com as águas da praia, margeada por coqueiros, bem em frente ao hostel, aberto por P. há um ano e três meses. Chama-se Enero, janeiro em espanhol, sua língua mãe. Nos seus dois andares, com amplas varandas, recebe gente do mundo todo. O nome escolhido revela, talvez, o desejo por um verão sem fim, que jamais esgote o delírio que trouxe seu dono a Maragogi.
P., hoje quase chegando aos 40 anos, também aluga bicicletas, mais uma de suas paixões (sempre detestou carros), e, mais recentemente, comprou um veleiro. E, depois mais um, embarcações que usa para levar turistas e andarilhos, como ele, para conhecer, “sem barulho de motor”, o lugar mais lindo do mundo, onde o mar encontra o céu. Um pedaço de paraíso chamado Maragogi.