Se você quiser um dia dizer que é eternamente grato a alguém, não se esqueça de colocar lá no topo da lista, entre os primeiros colocados, quem lhe ensinou a dizer uma palavra mágica: não. Três letras que, quando pronunciadas, ainda que com certa hesitação e conflito interno, podem salvar a sua vida. E poupar-lhe algumas dores de cabeça.
Se o sim é um caminho mais curto, ou aquela estrada sem curvas perigosas, com uma bela vista para o mar, ao menos aparentemente, o não provoca tempestades. Já se anuncia como um trovão retumbante, que muitas vezes faz os olhos se arregalarem, incrédulos ou contrariados. Parece moeda cunhada para comprar inimigos, ou confusões indesejadas. “Como assim, não?”.
Seu poder subversivo é tamanho que, em algumas culturas, existem desvios planejados linguisticamente para evitá-lo, camuflá-lo de tal forma que pareça jamais ter sido pronunciado, quando está ali o tempo todo a se reafirmar nessa eufemística invisibilidade. Uma verdade inconveniente em pacote de presente, com laço de fita.
“Se o sim é um caminho mais curto, ou aquela estrada sem curvas perigosas, com uma bela vista para o mar, ao menos aparentemente, o não provoca tempestades.”
Mas, acredite, quem lhe deu a oportunidade de descobrir o poder libertador da recusa, do não aceitar o que lhe é imposto, ou mesmo oferecido com gentileza, proporcionou a você, ainda que sem saber, uma inestimável aula de civilidade – e de auto sobrevivência. Colocou na sua mão o mapa da autonomia, do livre arbítrio.
Saber o que se quer na vida de verdade, de uma simples compra de supermercado a uma decisão mais crucial, como aceitar ou não uma proposta de emprego, pode ser uma quase utopia. Somos, em maior ou menor proporção, seres hesitantes, porque a existência é mesmo incerta, sempre em movimento, por mais imperceptível que esse deslocar seja na superfície. Agora, saber o que não se quer, identificar esse desejo de apertar o botão e descer do ônibus antes do ponto final, é um excelente começo. E uma libertação.
Todavia, parece que uma força invisível, uma conspiração de anjos algo perversos que nos sopram conselhos de aquiescência e submissão branda, nos levam a manear a cabeça, a sibilar o “esse”, para depois, rendidos à necessidade de aceitação, nos levam a concordar, a dizer “sim”, como se não tivéssemos outra saída. Daí vira uma palavrinha triste, acabrunhada.
Lá no fundo, como lava borbulhante, queremos cuspir um não pelos ares. Deixá-lo vir à tona pode ser catártico, acredite! Está certo, o silêncio que se segue costuma ser um tanto constrangedor, daqueles que fazem você sair correndo, mas a leveza que a coragem da recusa pode trazer valerá a pena. Apontará para rotas alternativas, talvez com paisagens não tão obviamente belas, mas que serão tão suas que poderão ganhar outros significados e levar você mais longe.
E daí você estará no volante.