Viver não é de graça. A vida cobra seu próprio preço em tempo, trauma, dor e remorso para cada centelha de felicidade que você pode viver, e a grande maioria sequer reconhece que está feliz e se queixa de qualquer coisinha sem saber que o pior ainda está por vir. Viver é caro.
Busca-se a felicidade porque dizem que é preciso buscar a felicidade. Mas também dizem que a felicidade não está aqui ou ali, e que não é algo que se possa ser alcançado. Que na verdade, bom mesmo é aproveitar os pequenos momentos felizes, formados de pequenos prazeres. Os grandes prazeres não. Estes são vazios, e devem ser evitados, porque nos enchem de sentimentos grandes demais para nossa própria compreensão. Bom é viver uma vida sem sobressaltos e sem surpresas e sem grandes prazeres porque, afinal, é preciso de foco. A vida necessita de foco para que se bote as coisas em movimento. Botam-se as coisas em movimento – as coisas que não são os prazeres – para atribuir sentido a tudo isso. Nada pior do que viver uma vida prazerosa e sem sentido, dizem. Dizem muitas coisas. Enquanto dizem e enquanto prazeres pequenos são buscados e prazeres grandes são evitados e tudo isso tenta ganhar algum sentido, a vida cobra seu preço em tempo, trauma dor e remorso.
“Os grandes prazeres não. Estes são vazios, e devem ser evitados, porque nos enchem de sentimentos grandes demais para nossa própria compreensão.”
Não há como escapar. Viver é como rolar por uma duna gigantesca de brasas abaixo. O único resultado possível é uma carcaça chamuscada e fumegante saudosa de seus tempos de colina acima. Alguém pode se dizer imune à dor, e pode ser que algum jeito de driblá-la se faça possível, mas a descida é imensa e não há artimanha que resista ao preço. Quem é fraco se machuca, quem é forte consegue fingir que não. O tempo, o trauma, a dor e o remorso são elementos comuns nas vidas mais díspares. Mas quem conseguir morrer sem trauma, sem dor e sem remorso também morreu sem tempo. Pura sorte.