Em meados de 2017, a compra das operações da Fnac no Brasil pela Livraria Cultura foi anunciada como iniciativa de salvar as posições da rede francesa por aqui. Pouco mais de um ano depois, no dia 16 de outubro, Sérgio Herz, presidente da Cultura, baixa as portas da última loja da Fnac. Antes de incorporar a concorrente ao grupo, a família Herz havia adquirido a Estante Virtual, principal player no mercado de livros usados.
A crise – adjetivada de “horrível” por Herz, em um semipleonasmo, durante entrevista à Exame – é tida como culpada pelo atraso nos pagamentos de fornecedores e ex-funcionários, que chegaram a protestar em frente à livraria para que pudessem receber suas indenizações trabalhistas. “Tem sido uma situação muito dolorosa para a empresa, mas temos planos consistentes para voltar à situação normal”, declarou Sérgio à revista.
O momento delicado que o mercado editorial passa não é recente. Em 2015, o lamaçal só não foi maior porque os livros para colorir ajudaram a salvar o balanço das livrarias.
O momento delicado que o mercado editorial passa não é recente. Em 2015, o lamaçal só não foi maior porque os livros para colorir – que chegaram a gerar discórdia se entravam ou não na lista de mais vendidos – ajudaram a salvar o balanço das livrarias. “A gente tinha uma preocupação muito grande desde janeiro”, afirmou naquele ano Marcos Petri, diretor comercial do Grupo Livrarias Curitiba, à Gazeta do Povo: “a nossa meta para o ano era atingir R$ 5,6 milhões em vendas. Achávamos que não iríamos conseguir. E se não fossem os livros de colorir, possivelmente não conseguiríamos mesmo. Só eles devem dar um crescimento de 3% a 5% nas vendas sobre o ano passado”.
Em 2018, parece não haver arrimo. Não bastasse a crise econômica, a literatura – e todas as outras expressões artísticas – está passando por uma fase de falta de confiança, de representação e de identificação. A guinada do país ao movimento de menor abertura cria uma cisão com a classe artística. Questiona-se a escolha dos livros usados nas escolas sem conhecer os critérios para a aquisição de obras, chegando ao absurdo de cair no canto da seria do batido “kit gay”, cuja obra não faz parte das indicações didáticas e paradidáticas do sistema público de ensino.
Recentemente, editoras e escritores se posicionaram frente ao possível desmantelamento dos ministérios da Cultura e da Educação no governo de Jair Bolsonaro. “Não podemos deixar de registrar, também, o risco de retrocessos que a candidatura opositora representa, ao apoiar projetos como o Escola sem Partido, que, a pretexto de instituir uma educação ‘neutra’ – ficção em qualquer país do mundo –, visa a doutrinar os alunos com o que há de mais retrógrado e a introduzir a delação na atividade docente”, escreveu Luiz Schwarcz, presidente e fundador da Companhia das Letras, em carta endereçada aos profissionais do setor editorial.
No momento em que, como afirma o filósofo sul-coreano Byung-chul Han, vivemos como enxames atrás de telas e surfando na onda das redes sociais e das fake news é compreender o conjunto infindável de zeros e uns da web como um não-lugar e não um refúgio. O lugar de refúgio cabe aos livros, à música, ao cinema. Às artes.