Uma das poucas certezas da nossa vida é a morte. Embora seja um clichê dizer isso, é também verdade que fugimos deste assunto de forma quase obstinada – como se pensar sobre ela fosse atrai-la, ou estragar o dia.
Pois a morte estará presente na nossa convivência em algum momento, independente de quão indesejável nós a consideremos. E a experiência do luto costuma ser sempre transformadora para todos nós que sobrevivemos à partida de nossos amados.
Por sorte, há grandes obras de escritores que registraram esse processo em livros delicados e profundos, que fornecem amparo para quem precisa, mas também demonstram que há poesia na perda. Neste texto, apresentamos cinco destes livros.
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O ano do pensamento mágico, de Joan Didion
A importante escritora Joan Didion escreveu O ano do pensamento mágico em 2005, livro que se tornou uma referência na discussão sobre luto. Ela narra aqui o ano de 2004, quando viu seu marido falecer de um ataque cardíaco fulminante, ao mesmo tempo que a única filha do casal estava internada por uma doença grave.
A obra é surpreendente por conta da franqueza de Joan Didion, que aborda a questão da perda em seus aspectos menos palpáveis – como os pensamentos que percorrem a mente do enlutado e não encontram qualquer interlocutor disposto a ouvi-los.
A abertura do romance já esclarece que ele trata da imponderabilidade da morte, que está sempre à espreita. “A vida muda rapidamente. A vida muda em um instante. Você se senta para jantar, e a vida que você conhecia termina”, escreve Didion.
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A invenção da solidão, de Paul Auster
Após perder o pai, Paul Auster cria uma obra intrigante, que mistura o ensaio com o relato autobiográfico. Ele tenta examinar a memória do pai a partir dos seus pertences, pois sabia pouca coisa sobre ele. Este homem solitário então é “inventariado” pelo filho, que tenta entendê-lo por meio de pistas.
Escreve Auster: “num dia há vida. Um homem, por exemplo, com ótima saúde, nem sequer velho, sem qualquer caso de doença. Tudo é como foi antes, como sempre será. E então, subitamente, acontece a morte. (…) A vida torna-se morte, e é como se tal morte houvesse possuído essa vida o tempo todo. Morte sem aviso. Equivale a dizer: a vida para. E pode parar a qualquer momento”.
A Invenção da Solidão é dividido em duas partes. Na primeira, “Retrato de um homem invisível”, Paul Auster fala de sua investigação em torno do pai, em um relato muito tocante. Na segunda, “O livro da memória”, o escritor mistura uma reflexão sobre sua relação com seu filho com análises de clássicos da literatura, trazendo um caráter teórico também à obra.
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Uma questão de vida e morte, de Marilyn e Irvin D. Yalom
O terapeuta Irvin D. Yalom é um autor best-seller cultuado no mundo todo (talvez você lembre do nome de seu maior sucesso, Quando Nietzsche chorou). Suas obras têm uma importante participação na popularização do debate sobre psicoterapia entre seus leitores.
Uma Questão de Vida e Morte, no entanto, é especial na sua carreira, uma vez que ele foi escrito a quatro mãos. Irvin o constrói junto com sua esposa, Marilyn, que acaba de ser diagnosticada com um câncer terminal. Eles resolvem escrever uma obra em conjunto, alternando os capítulos com a visão de cada um sobre o que estão passando.
Quando Marilyn morre, Irvin segue percorrendo o livro abordando o seu processo conflituoso com o luto, mesmo depois de ter orientado centenas de analisandos durante sua carreira.
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Paula, de Isabel Allende
A chilena Isabel Allende (autora de A casa dos espíritos, dentre outras obras) escreveu Paula em 1995 para contar a história da filha de nome que batiza a obra, que em 1991, aos 28 anos, foi internada na Espanha por uma doença hereditária chamada porfiria. Paula entra em coma e não resta opção à mãe além de acompanhá-la, na expectativa de sua melhora (o que nunca ocorreu).
Durante a espera, a editora de Isabel Allende deixa com ela um bloco e sugere que ela escreva uma carta para Paula. A princípio, a escritora rejeita a ideia, mas logo volta atrás e começa ali a surgir uma narrativa potente, que fala da filha e da própria história da família Allende, que é profundamente conectada à história do Chile.
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O pai da menina morta, de Tiago Ferro
O escritor Tiago Ferro aborda neste livro a perda da filha Manuela aos 8 anos, por uma razão aparentemente banal: as complicações de uma gripe Influenza B. O teor devastador do luto aparece aqui da forma mais crua, enquanto Ferro relata, de maneira muito aberta, o que a morte da filha provocou nele.
A narrativa fragmentada de O Pai da Menina Morta se equipara à sensação de fragmentação do autor após a morte. Já não sabe ao certo qual é a sua identidade e, por isso mesmo, fala de si não pelo nome, mas como o “Pai da menina morta”.
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