Trocando em Miúdos: 92 Graus abre campanha de arrecadação de fundos para aquisição de sua sede. Se não atingir a meta, emblemático espaço cultural curitibano deve fechar as portas.
“Seja Marginal, Seja Herói”. Hélio Oiticica usou esta frase para eternizar uma série de trabalhos que ficaram conhecidos como marginália ou cultura marginal. Na década de 1960, o desejo por transformações sociais e comportamentais guiava as manifestações artístico-culturais. Oiticica, então, propunha uma estética que flertava com a ausência de regras.
O multiartista acreditava que era possível atingir um estado criativo a partir da redescoberta e da libertade de imposições éticas e estéticas. Logo, talvez tenha sido um de nossos mais importantes transgressores.
O principal elemento do rock – e suas várias vertentes – sempre foi a transgressão, ou como disse certa vez o colega André Forastieri, “rock é rebelião adolescente”. Acontece que, além de transgressor, o rock também precisa de um lugar onde possa acontecer, pois, sem ocasião não há rebeldia. A verdade é que não existe cena local sem bares, casas de show e espaços culturais. Eles é que são os responsáveis, mesmo que despretensiosamente, por garimpar os novos talentos, ou ao menos oferecer espaço para que o próprio público lapide os artistas.
Em Curitiba, é difícil imaginar um lugar que caiba melhor na descrição de fomentador da cena musical do que o 92 Graus. Ao longo de mais de 20 anos, o bar e seu proprietário, J.R. Ferreira, se confundem, sendo impossível dissociá-los. Ferreira está para a música no Paraná tal qual Hélio Oiticica para as artes no Brasil.

Não se assuste com a comparação. Cultura sempre foi vista como subproduto, descartável. Não por acaso, dificilmente eventos culturais saem das gavetas de produtores e produtoras sem incentivo do poder público. Neste cenário, J.R. Ferreira e 92 Graus, com suas mais de 400 apresentações anuais – mais de 50% dos eventos musicais independentes realizados em Curitiba – são verdadeiros heróis ao transgredirem a força especulativa do mercado imobiliário e a inércia de parte do público, que insiste em rejeitar os produtos locais em detrimento do mainstream.
“J.R. Ferreira e 92 Graus, com suas mais de 400 apresentações anuais – mais de 50% dos eventos musicais independentes realizados em Curitiba – são verdadeiros heróis ao transgredirem a força especulativa do mercado imobiliário e a inércia de parte do público.”
Acontece que toda essa história pode simplesmente desaparecer. Depois de algumas idas e vindas por diferentes endereços, o 92 Graus se estabeleceu no número 108 da Avenida Manoel Ribas. Entretanto, os proprietários do imóvel decidiram colocá-lo à venda, deixando J.R. Ferreira com um grande problema: ou adquire o imóvel ou terá que desocupá-lo, o que, segundo Ferreira, poderia causar o fechamento definitivo do espaço cultural.

Talvez, Fugazi, Man or Astroman?, Agnostic Front, Agent Orange e Toy Dolls não sejam bandas que o leitor conheça. Raimundos, Cólera, Replicantes e Ratos de Porão também podem não fazer parte da trilha sonora de suas vidas. A meu ver, o ponto importante aqui não é o conhecimento dos grupos ou a empatia com as manifestações artístico-culturais que lá ocorrem, mas sim o fechamento de mais um espaço destinado à cultura.
Ela, que sempre foi reflexo da sociedade e a sociedade seu reflexo. Nessa via de mão dupla, quando é criado um buraco em um dos lados, estipula-se que o caminho é só de ida, e decifrando a metáfora, isso significa que joga-se uma pá de cal não apenas no espaço físico, mas, principalmente, no público consumidor, nos artistas locais e no coração de nossa identidade cultural.
Visando contornar este obstáculo, J.R. Ferreira lançou uma campanha de arrecadação coletiva no site Kickante. Seu objetivo é arrecadar 60% do valor do imóvel, cerca de R$ 460 mil, possibilitando a aquisição junto ao atual proprietário. No texto publicado no site, ainda afirma que, caso consiga atingir a meta e efetuar a compra, tornará o 92 Graus em um museu da música alternativa, além de estúdio para gravações e ensaios.
Você pode ajudar colaborando financeiramente (existem várias faixas de valores), e também passando o endereço da campanha no Kickante adiante. Acreditamos que, como na música (e no nome da campanha), o show não pode parar.
92 Graus, velho, saravá!
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Como ajudar
Participar é fácil. Acesse o Kickante (clique aqui), escolha o valor da sua contribuição (toda contribuição vem com uma recompensa), e em seguida escolha a forma de pagamento (boleto ou cartão de crédito – possível parcelamento em até 6x).