Determinadas vezes, alguns sons entram pelos meus ouvidos e levo um tempo para maturar o que falar a respeito. Costumo dar um tempo para que, ao escrever, venha à tona, da melhor forma possível, tudo que senti e captei do trabalho em questão. No caso do Foba, grupo paranaense liderado por Giuliano Batista, e do qual fazem parte Wonder Bettin, Thiago Busse, Yuri Vasselai e Thiago Jorge, o tempo também esteve relacionado com uma viagem no tempo. Coroados, o primeiro EP do grupo, lançado em 2013, foi uma sacolejada necessária em um momento que a cidade (e o Brasil) estavam sendo inundados pelo folk, indie folk, neo-indie e congêneres. É bom deixar claro que não faço nenhum juízo de valor aos tais grupos, apenas constato que sofremos do mal da produção em série: um sucesso costuma ser entendido como uma fórmula, o que entope a cena musical de reproduções de mais do mesmo. Talvez por isso, a sonoridade vanguardista de Coroados era o prenúncio do que viria anos depois. Riffs penetrantes, uma fuga do tédio das grandes cidades, tudo lambuzado com muita psicodelia.
Havia, ainda, uma viagem para revisitar sonoridades de uma década anterior. Entre Gram e Pullovers, o Foba batia o selo curitibano da ironia – não há outra característica mais marcante em letras de compositores locais do que esta – com aquela pungência verbal dos grupos paulistanos do início dos anos 2000. Para quem, tal como eu, viveu a efervescência indie paulistana da década de 1990, é fácil captar que havia (e ainda há) no grupo curitibano uma sede por autenticidade, assim como os bares da “Pauliceia Desvairada” se acostumaram reverberar.
O ano que passou chegou com boas novas – e ótimos riffs. O Foba veio com novo EP, o complexo Gilgamesh. Suas três faixas mostram uma evolução salutar para o grupo, ainda centrada na psicodelia, marca de inúmeros excelentes projetos lançados no ano (Boogarins, Cidadão Instigado, dentre outros). Se esse revival psicodélico brasileiro tem um aspecto positivo – e tem! -, é sua capacidade de se fundir com outros ritmos, criando trabalhos completamente distintos, ainda que a raiz seja a mesma. Dessa forma, os músicos do Foba mostram uma das características mais incríveis dessa insanidade chamada rock n’ roll: sua capacidade de se reinventar.
Se “Eu Só Tenho uma Pistola, uma Viola e uma Mulher” puxou o lançamento de 2013, e os riffs e solos de “Eu e Ela e o Amor” eram o cartaz da competente estreia, Gilgamesh é mais uniforme, ainda que “Ficando Velho” possua um solo no bridge tão entorpecente quanto o da primeira faixa do EP de 2013.
“Cão do Inferno” ganhou um videoclipe, com roteiro do de Giuliano Batista, vocalista do Foba. O titulo da canção faz referência à definição de amor dado por Bukowski em O Amor é um Cão dos Diabos. Alucinado, como o próprio Gilgamesh, o filme retrata um ambiente desértico com assassinatos, pessoas com cabeças de animas, álcool e alta velocidade. Sorte a nossa que toda essa aventura insana está tão perto de nós. Que venham os shows em 2016.
Produzido, gravado e mixado por Thiago Jorge, Gilgamesh está para audição e download no Soundcloud (acesse clicando aqui) da banda. Você também pode ouvi-lo na íntegra no Spotify.