O Brasil é um celeiro criativo quando o assunto é música, e Curitiba não escapa a essa máxima. Ainda que quando os tema sejam criatividade, inovação e uma música “verdadeiramente brasileira” as opiniões sejam divergentes, desde sempre a música local foi uma fusão entre tudo que era feito no mundo com as particularidades regionais deste país de dimensões continentais. E neste contexto encontramos o trabalho da Paranambuco, grupo curitibano formado em 2010 pela união de cinco integrantes de diferentes estados do país, que encontraram na música seu denominador comum.
“Nós nos conhecemos a partir da vivência musical e espiritual de terreiro, e somos apaixonados por cultura popular”, contam os integrantes da banda em um papo realizado nesta última semana. “Ainda por cima, somos amigos que gostam de estar juntos”, complementam os músicos do grupo, composto por Thaís Rolim, Matheus Braga, Fred Pedrosa, Bruno Klammer e José Navarro.
Escolhidos como banda revelação do Webfestvalda, no Rio de Janeiro, em 2015, a banda é mais uma integrante desta geração que vê na antropofagia cultural maneiras de soar de modo mais próximo, moderno e sincero. Da lambada do Figueroas ao brega de Johnny Hooker, cada vez mais os regionalismos abrem espaço para uma nova geração de artistas, mas, também, de fãs, que acham uma boa maneira para se conectar com o país e suas diferentes realidades. “Esse flerte não é atual”, afirmam os músicos. “É justo que nos apropriemos daquilo que é nosso, das festas populares, dos ritmos de cultura popular – que, no limite, é a cultura dos populares que somos nós”, complementam.
O bom resultado no festival do Rio de Janeiro trouxe maior visibilidade à banda, além da possibilidade de entrar em contato com artistas de diversos locais do país. “Este contato talvez tenha sido o melhor retorno”. O resultado não pode ser interpretado como pequeno. Festivais competitivos e programas televisivos de talento musical ainda sofrem enorme preconceito em parte do público, que vê com desconfiança os artistas que saem vencedores deles.

CENA CURITIBANA E A CULTURA
Que Curitiba há décadas possui uma cena musical forte e diversa ninguém é louco de discutir. Não obstante, as dificuldades estão aí a olhos vistos, ainda que não seja uma realidade exclusivamente curitibana. Os espaços, ainda raros, costumam ser disputados com grupos de tributo, sem contar a baixa remuneração. Dentro deste contexto, mesmo a Paranambuco, por vezes, recorre a um repertório cover para algumas de suas apresentações em casas noturnas da cidade. “É uma estratégia que se soma ao trabalho autoral”, apontam.
‘É justo que nos apropriemos daquilo que é nosso, das festas populares, dos ritmos de cultura popular’.
“Fomentar a cultura de se consumir música local é algo complicado”. A frase dita pelos integrantes da banda encontra eco quando relembramos, por exemplo, a crise pela qual passou o 92 Graus, um dos mais icônicos bares de música independente da cidade. “As principais dificuldades [que encontramos] são fomentar espaço, público e remuneração adequada para os grupos que realizam trabalhos de música autoral [na cidade]”.
Impossível não discutir a partir das colocações a forma como encaramos a cultura. Grande vítima da crise econômica e política que assola o país, boatos acerca das leis de incentivo à cultura também ajudam a reforçar o caráter preconceituoso com que parcelas da população tratam artistas. “É difícil generalizar. De uma forma geral, entretanto, é possível perceber que existe uma maioria que não entende o que é identidade cultural e, portanto, não compreende a importância das artes na vida das pessoas”.
Mas, apesar das dificuldades, os músicos também encontram em Curitiba uma pulsão grande quando o assunto é a diversidade musical. “[Na] cidade acontecem movimentos culturais diversos, como arrastão de maracatu, pré-carnaval em diversos blocos na rua, encontros de música de terreiro (atabaque de ouro), diversos terreiros de umbanda”, contam. “É impossível ficar imune a esta diversidade”.
O PRESENTE E O FUTURO DA PARANAMBUCO
Esmiuçar a sonoridade da Paranambuco é encontrar criações a partir de elementos como samba de roda, xote, baião e maculelê, um diálogo contínuo entre perfis culturais distintos, próximos ou não. “A pluralidade de referências culturais talvez seja uma das maiores marcas da cultura brasileira”, citam os integrantes do grupo, que em 2015 lançou seu primeiro e, até agora, único disco, Orun Ayê.
De lá para cá, as principais diferenças que os próprios músicos notam é a forma como eles entendem, fazem e estão em contato com a música. “Comentávamos entre nós sobre a diferença que se tem entre os vídeos de ‘Orun Ayê’ e ‘Desperta’. Foram gravados na mesma sala, do mesmo estúdio, com o mesmo técnico de som. No entanto, é possível perceber grandes diferenças”.
Gravado de forma independente com recursos oriundos da vitória no Festival Online de Composição, o disco reforça este novo cenário para grupos independentes, onde a gravação e distribuição de CDs e EPs acontece com muito mais facilidade que há 20 anos atrás, inclusive tendo os fãs um papel preponderante para muitos artistas. “Nosso trabalho foi e é pautado no incentivo do público e editais de fomento à cultura”, contam.
Sobre o futuro, a banda segue lançando material que não está presente em Orun Ayê. A ideia é voltar a produzir material audiovisual das músicas da banda. “Pretendemos fomentar nossa produção e, quando possível, gravar um novo disco”. Que não tarde a chegar.