Chegamos a um ponto onde falar sobre a Trombone de Frutas exige uma pausa, ainda que o próprio grupo não tenha feito isso entre Chanti, Charango (2014) e seu mais novo trabalho, Chanti Alpïsti. A banda cria um jogo musical em que encerrar um álbum e começar outro ecoando as mesmas notas diz muito sem dizer absolutamente nada, criando um mito em torno do fato que, a grosso modo, pouco nos importa procurar uma explicação para a escolha. Ainda assim, fazemos uma pausa para refletir.
A reflexão também parte pelos momentos distintos. Muito e, ao mesmo tempo, nada mudou de 2014 para 2016. Se nossas estruturas são as mesmas, se as dificuldades ainda se apresentam e se ainda nadamos contra a corrente, hoje a Trombone de Frutas é uma banda com seu próprio espaço artístico: gerenciado pelos seis integrantes da banda, a Arnica Cultural é um espaço plural pensado de dentro para fora de modo a expandir de fora para dentro. Acrescente aí uma turnê pela Argentina e um show já histórico com Jards Macalé no Beer Garden Sláinte.
Produzido por Maycon Ananias e pela própria banda, Chanti Alpïsti é um marco em tempos de urgência com suas faixas extrapolando cinco, seis minutos, e trazendo arranjos que rompem com a arquitetura básica de uma banda, abraçando a construção de paisagens sonoras elementares na absorção dessa salada rítmica proposta pelo grupo curitibano.
A banda mantém o espírito quente, por vezes furioso e sempre repleto de paixão e entrega lírica e musical que já havíamos visto no disco anterior.
No álbum, a Trombone investe em experimentalismo musical, flertando com jazz rock e psicodelia, além de referências africanas e latinas, abusando de ecos, distorções e riffs frenéticos, que são muitas vezes dissonantes. Variações rítmicas como em “São Gonçárabe”, faixa que abre Chanti Alpïsti, dão o tom no disco, deixando qualquer fórmula pré-concebida para trás, mas mantendo o espírito quente, por vezes furioso e sempre repleto de paixão e entrega lírica e musical que já havíamos visto no disco anterior.
“Ela Inventou” e “A Missa” fazem uma dobradinha harmoniosa e potente em que a partida é tema recorrente. Essa onda de ideias e sons que influenciam o trabalho demostram um sexteto sem medo de caminhar por faixas tão distintas, dialogando com antíteses e arriscando artisticamente, se permitindo diminuir o ritmo (como em “Alpha 42”) e convidando o ouvinte a dialogar com a banda, trocar experiências que só poderiam surgir de nossa humana (sobre)vivência. “Tchitchilia” e “Me N U” complementam esse clima próximo e acolhedor de Chanti Alpïsti, que procura paz e amigos “para viver a vida”.
Hermanamente, tanto quanto possível dessa latinidade tão presente no DNA da Trombone de Frutas, “Tanguera” encerra um trabalho ímpar por sua potência, sua coragem e sua experimentação, essa capacidade tão única de mergulhar o ouvinte em texturas conceituais, evocando a força dessa coisa incrível chamada música. Como disse no início, é impossível não refletir ao ouvir a Trombone. Pois, reflitam (e, consequentemente, ouçam).