No início dos anos 90, o mundo era tomado de assalto pela moçada da cabeleira ensebada, calça jeans e All Star detonados. Nevermind, do Nirvana, abalava as estruturas do mainstream como uma wrecking ball esmigalha colunas de concreto. Pearl Jam, Alice in Chains e Soundgarden formavam a brigada de elite, uma vez que a banda de Kurt Cobain assentava-se absoluta no trono do grunge/rock alternativo.
Para os que viram o surgimento do fenômeno, talvez, seja difícil notar que quase 30 anos se passaram, mas, passaram. Deve ser porque o fôlego das canções ainda esteja ok. É provável. Afinal, “Alive”, “Even Flow”, “Jeremy” e “Black” (Pearl Jam), “We Die Young”, “Man in the Box”, “Sea of Sorrow” (Alice in Chains), “Rusty Cage” e “Outshined” (Soundgardem) dominaram paradas de sucesso e o coração da molecada ao redor do mundo de forma somente vista na beatlemania.
Aqui não tem flerte com heavy metal e também não há porra-louquices – comuns nos álbuns anteriores. Mas há sinceridade e peso. E groove. Muito groove!
Nada era muito desafiante, contudo, de um ponto de vista técnico: guitarras distorcidas, movidas a powerchords, volume no talo e força física selvagem nas performances ao vivo. O básico dessa galera era realmente básico. Não básico como Ramones, que inclusive os influenciou, mas, digamos, bem básico. Ao mesmo tempo, uma nova geração de roqueiros iniciantes já não via graça nenhuma nas firulas manjadas de guitarristas do hard rock, por exemplo, e da certa insipidez de bandas como U2.
Garotos e garotas sem ouvidos pra pauleira de Slayers da vida, mas demasiadamente ávidos por outras possibilidades para serem satisfeitos apenas com a melancolia de Seattle. Possivelmente este foi um dos flancos da multidão atacados inicialmente pela horda de freaks do Red Hot Chili Peppers. Junto ao Faith no More, seriam reconhecidos no subgênero funk metal.
Qualquer ser humano que fique poucos segundos exposto ao conjunto sonoro e visual dos californianos, independente de qualquer coisa, logo se convencerá que está diante de algo singular. Opiniões formadas basicamente pelo gosto à parte, não apareceu nada semelhante ao Red Hot Chili Peppers naquele contexto, tampouco antes ou depois. E entre muitos altos e baixos na carreira, momentos brilhantes e outros nem tanto, Blood Sugar Sex Magik, quinto álbum dos caras, lançado em 24 de setembro de 1991, traz, como nunca, a essência do grupo.
Produzido por Rick Rubin, o Midas da indústria musical da época, Blood Sugar Sex Magik é diferente de tudo que a banda havia produzido até então e que produziria depois. O registro foi também o primeiro de uma longeva e bem sucedida parceria com a Warner Bros. Records.
O álbum vendeu mais de 13 milhões de cópias em todo o mundo e cravou o Red Hot Chili Peppers no cenário mundial para nunca mais sair. Além disso, finalmente, a banda seria aclamada pela crítica. O álbum é uma coleção de hits: “Under the Bridge”, “Give It Away”, “Suck My Kiss”, “Breaking the Girl”, “If You Have to Ask” e a faixa que dá nome ao trabalho, “Blood Sugar Sex Magik”, tocaram e tocam até hoje nas rádios sobreviventes ao tsunami da internet.
Os timbres flats das guitarras de John Frusciante inovaram a estética sonora da banda. Na verdade, a aurora musical do guitarrista está também neste álbum. Aos 19 anos, Frusciante fora escalado para substituir Hillel Slovak, morto em decorrência de uma overdose de heroína no dia 25 de Junho de 1988. Mother’s Milk foi o primeiro trabalho do garoto prodígio no RHCP. E foi de fato um prodígio: quem toca guitarra e já gravou uma vez que seja sabe do que estou falando (saquem o groove do guri, a partir do 3’44” do vídeo abaixo, lembrando que o baixista ali é o Flea e o piá tem 21 anos, na ocasião).
O álbum Blood Sugar Sex Magik é: vocais que usam e abusam de influências de rap e hip hop, baixos memoráveis, guitarras inspiradas cujas levadas influenciariam meio mundo no pop que o sucedeu e bateras enérgicas, sólidas e seguras. E as letras, claro: sexo, drogas, amizade, morte, amor, política, mais sexo, e sexo, sexo, sexo… sem dúvida, Antony Kiedis expôs sua alma de poeta em performances memoráveis, como acontece na faixa “Sir Psycho Sexy”.
Então, o RHCP consolidou a carreira na esteira do grunge, talvez? Bem possível que sim, de alguma forma. Mas o fato é que quase trinta anos depois de seu lançamento, Blood Sugar Sex Magik é tão indispensável para um garoto que esteja montando uma banda agora, quanto para um coroa que ainda não tenha tido o prazer em conhecer. A energia sexual açucarada, mágica e vivaz que a obra exala não é encontrada com frequência na música contemporânea.
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