O músico Jeff Buckley nasceu em 1966, e se estivesse vivo, completaria 51 anos no dia 17 de novembro. Buckley havia desaparecido no dia 29 de maio de 1997, enquanto nadava no rio Wolf, um dos afluentes do Mississipi. Diferente de outros acontecimentos que completaram – ou completam – 25 anos esse ano, pouco se falou sobre o aniversário de morte do músico norte-americano.
Buckley era filho de Tim Buckley, também músico e morto precocemente de uma overdose de heroína nos anos 70. Quando Jeff Buckley morreu, sua carreira mal havia começado, deixando dezenas de gravações inacabadas e apenas um álbum completo, Grace, lançado em 1994. Ao longo dos anos que se sucederam à morte do músico, muitas das gravações foram compiladas, concluídas e lançadas, talvez numa tentativa de manter viva a lenda que envolve os artistas que morrem jovens.
A carreira de Jeff Buckley começou em oficialmente em 1991, quando o cantor foi convidado para homenagear seu próprio pai e chamou a atenção de Gary Lucas, que o convidaria para integrar a banda Gods and Monsters. Buckley rejeitou o convite (apesar de ter contado com a colaboração de Lucas como guitarrista para a composição de algumas de suas faixas mais importantes, como “Mojo Pin”, que abre Grace) porque julgou que essa decisão atrapalharia sua carreira. Hoje, podemos afirmar que ele estava realmente certo e que sua carreira solo foi muito mais significativa do que talvez tivesse sido como mero vocalista de mais uma banda durante os anos 1990.
Fato é que, passados 25 anos, Grace soa anacrônico e, ainda assim, excelente. A acurada técnica vocal de Buckley e as guitarras talvez sejam os elementos que mais se sobressaem à primeira audição. Ainda mais do que isso, a combinação de elementos sonoros que, propositalmente, à época parecia revistar sonoridades dos anos 1970, não possui quase nenhuma similaridade com o que está sendo feito hoje em dia. O grande legado de Buckley talvez esteja condensado na imensa gama de artistas que foi influenciada por Grace: Muse, Coldplay e Travis, apenas para citar algumas das bandas mais mainstream que incluiram o cantor como uma de uma de suas referências.
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O que não envelheceu em Grace e ainda soa potente e cristalina é a voz de Buckley e seu talento como compositor. O álbum ainda soa como se estivesse desde o começo predestinado a ser tornar uma espécie de clássico às avessas. Na ressaca do grunge e no vácuo deixado pela morte de Kurt Cobain, a mídia parecia procurar alguém para alçar ao controverso pódio do salvador do rock. A matéria da Folha de São Paulo que fala da morte de Buckley chega a citar Gene Bowen, um dos empresários do cantor na época de sua morte e as estratégias pensadas para transformá-lo em um novo Elvis.
A questão é que as músicas de Jeff Buckley jamais tiveram o mesmo tipo de apelo que as canções de Elvis Presley. Intimista, oscilando entre o alternativo e o jazz, as composições de Buckley parecem feitas sob medida para o tipo de lugar no qual o músico gostava de se apresentar: pequenos clubes e casas noturnas, lugares onde a acústica bem planejada de suas canções poderia de fato soar fiel.
Um bom exemplo disso é o álbum Mistery White Boy, composto de gravações ao vivo que datam de 1995 e 1996, quando Buckley fez a turnê de seu único álbum completo. Longe de ser um disco marcante, Mistery White Boy serve para adensar o mito, deixando entrever não apenas o talento vocal do artista – que chega a imitar Edith Piaf num determinado momento – como também sua capacidade como guitarrista.
Jeff Buckley era impulsivo e virtuoso e todo o material que deixou para trás apenas corrobora isso, fazendo com que inevitavelmente nos perguntemos o que ele estaria fazendo se estivesse vivo hoje.
Ao longo dos anos, tudo que existe de perfeição em Grace foi explorado até o limite do tolerável. Seja o cover (absolutamente inesquecível) de “Hallelujah” ou “The last goodbye”, uma das músicas mais comerciais do álbum. Ficar repetindo sobre o brilhantismo de um álbum lançado há quase 25 anos atrás parece desnecessário. Muito mais necessário é revisitar Jeff Buckley, mergulhar no inacabamento de sua obra e descobrir que, talvez, 25 anos depois, ainda não tenha surgido alguém que se equipare a ele em talento e personalidade.
Jeff Buckley era impulsivo e virtuoso e todo o material que deixou para trás apenas corrobora isso, fazendo com que inevitavelmente nos perguntemos o que ele estaria fazendo se estivesse vivo hoje. O potencial abreviado pela morte precoce, de maneira análoga a muitos outros ícones da música como Jimi Hendrix e Kurt Cobain, deixa obviamente muito mais perguntas que respostas, principalmente no caso de Buckley.
A autópsia do cantor não apontou drogas ou álcool, nenhum dos elementos que comumente estão envolvidos nas mortes acidentais e trágicas de grande parte dos astros de rock. Assim, ficamos com o legado em aberto, com as gravações ao vivo, com a visão musical inacabada de um artista que jamais teremos a oportunidade ver amadurecer, preso para sempre no meio do caminho entre a fama e o culto, entre a vida que poderia ter sido e a morte que se concretizou.
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