Teoricamente surgido em meados da década de 1970, o noise ganhou espaço (e subdivisões) durante os anos 80. Na mesma época, o lo-fi, aquelas gravações de baixa fidelidade, geralmente feitas por questões financeiras, também ganhou adeptos, até que mais recentemente se tornou opção estética para compor uma sonoridade mais “estranha”.
Mais recentemente, enquanto toda uma geração de novos artistas surge em tempos que gravar e divulgar sua música são práticas muito mais fáceis – ainda que o acesso a essas músicas nesse mundo de infinitas produções seja complicado (e papo para outro texto) – uma outra, da qual fiz e faço parte, sabia de toda as agruras que era ser um artista independente. Toda essa complicação era (e ainda é, diga-se) amplificada se você estivesse fora do eixo Rio-São Paulo, ou que não estivesse ao menos nas rebarbas deste eixo.
E qual não é a alegria em encontrar um grupo capaz de juntar esses dois aspectos, emergindo uma sonoridade com menos pretensões estéticas e mais reflexo de possibilidades, resultando em um trabalho interessante em virtude de sua crueza. Com o nome de um dos grandes discos da história do The Jesus and Mary Chain, não por acaso um grupo que fez do noise sua fortaleza, os amapaenses da Psychocandy vêm fazendo barulho muito além de Santana, cidade da Região Metropolitana de Macapá na qual residem.
Formada em janeiro de 2012, a Psychocandy é um power trio orgulhoso de seu rock direto, áspero e urgente. Wendril Ferreira, Maély Hévelin e Danilo Aguiar carregam nas costas dois EPs e dois singles, frutos do maior espírito barulhento e de baixa fidelidade. Of the Soul to the Reality, de 2012, tem o peso de timbres e arranjos que remetem à sonoridade do Joy Division, mas por sorte não soa mimético, talvez a maior dificuldade para qualquer grupo que busca referências neste recorte da música mundial na virada da década de 1970 para 1980.
Psychocandy é um power trio orgulhoso de seu rock direto, áspero e urgente. Wendril Ferreira, Maély Hévelin e Danilo Aguiar carregam nas costas dois EPs e dois singles, frutos do maior espírito barulhento e de baixa fidelidade.
Enquantos os riffs da guitarra de Ferreira flutuam, as linhas de baixo de Aguiar e as batidas secas da enérgica Hévelin criam um uma narrativa soturna e densa, ainda que volta e meia uma quebra rítmica seja responsável por fazer com que batuquemos a canção; há pequenas nuances do que os goianos da Cambriana fizeram em House of Tolerance quando o trio acelera em uma roupagem mais beat.
Neuroeuforia, de 2014, possui uma urgência muito semelhante a do disco anterior, ainda que aqui seja possível notar mais influências da cena noise oitentista. Aqui chama a atenção a opção em inserir algumas composições em português, algo não visto em Of the Soul to the Reality. O resultado é um disco tão cru quanto o anterior, mas com duas facetas distintas. Enquanto as canções em português (em especial “Dive”) soam ligeiramente mais shoegaze, as em inglês fazem jus à referência aos escoceses do The Jesus and Mary Chain.
Lançados ambos neste 2016, “Noise in Your Life” e “Noise Rock Endless” são semelhantes no fato de soarem melhor produzidas, mas seguem a mesma regra que o power trio amapaense construiu nestes quase 5 anos de palcos, capaz de reverberar na fria Curitiba com a mesma potência que sai dos instrumentos de Wendril, Maély e Danilo. Alguém ainda tem alguma dúvida que a música não tem fronteiras?
Agora só falta que estreitemos ainda mais essa distância geográfica para ver a Psychocandy no Centro-Sul do país. Não são nem eles, somos nós os merecedores.
NO RADAR | Psychocandy
Onde: Santana, Amapá.
Quando: 2012.
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