O saudoso Lula Queiroga, músico pernambucano, me ensinou uma das coisas que carrego até hoje. Durante os ensaios para o Palco Pernambuco de 2004, o músico se virou para mim e disse: “sabe como você reconhece que uma banda é boa? Quando ela ao vivo e em estúdio são a mesma”. A frase do eterno companheiro de composições de Lenine carrega muito peso e faz todo sentido.
Existem grandes bandas no palco que, às vezes, fazem de discos medianos bons, e existem bandas sem presença de palco com discos de estúdio fantásticos. No fim, a música continua sendo maravilhosa por não ser um exercício matemático. Não adianta ser preciso ao enfiar cada riff tímpano abaixo se isso for feito metodicamente, mecanicamente.
Chegando ao terceiro disco, a Colaterall se encaixa perfeitamente no exemplo de grupo que consegue reproduzir o que fazem em estúdio nos palcos. Rinha, sucessor de Inferno Astral, é o ápice do trabalho do grupo liderado por Vini Zampieri. E se alguém ainda tinha o (péssimo) hábito de chamá-los de “a banda do ex-integrante do Sugar Kane”, fica dado o recado: isso não passa nem próximo de ser verdade.
Ainda que as primeiras canções tivessem pequenos detalhes que pudessem remeter à sonoridade do Sugar Kane (à época de formação da Colaterall, Vini ainda pertencia ao seu antigo grupo), a banda sempre teve uma personalidade bem definida. Originalidade, peso e letras marcantes estiveram no quarteto desde o início. Além de Vini, Diogo Zotto, Rafael Gasparim e Preto Murara completam o elenco.
Rinha também faz as vezes de exercício político através da música, sendo coerente, honesto e sem tropeçar no oportunismo.
Rinha é um disco muito mais maduro e homogêneo. Mantendo a arte de criarem riffs potentes, Zampieri e Zotto parecem ter encontrado a palhetada perfeira no novo trabalho. Produzido por Alexandre Capilé no Estúdio Costella, em São Paulo, o álbum conta com 10 faixas, com destaque para “Pessoas Felizes são Perigosas” e a homônima “Rinha”.
Em ritmo acelerado, “Pessoas Felizes são Perigosas” traz, além de um belo riff durante o bridge, Preto Murara levando nossos ouvidos ao delírio. “Rinha” guarda um subtexto crítico muito forte. Como apontado em entrevista ao jornal Gazeta do Povo por Vini, a faixa, escrita há 5 anos, mas lançada apenas agora, é “um desabafo, uma maneira de se expressar, uma vez que a situação do Brasil bate na cara da gente”. E o quarteto deixa isso bem claro. “Todos querem essa teta / Todos querem fazer parte da festa / Vamos logo mergulhar no dinheiro”, canta o grupo na estrofe inicial. “Rinha” ganhou um videoclipe, lançado na última sexta-feira (veja acima).
Depois de anos em que o rock foi duramente criticado pela falta de posicionamento político, Rinha também faz as vezes de exercício político através da música, sendo coerente, honesto e sem tropeçar no oportunismo. Como diz o título deste texto, ele é a Colaterall no seu ponto mais alto e de onde dificilmente alguém os irá tirar.