Por Rafael Perich*, especial para Escotilha
A cultura no Brasil tem em suas políticas públicas um histórico de personalismo partidário. Em seu primeiro período, durante a Era Vargas (1930-1945), a política cultural levava em conta a ideia de trazer à tona uma “cultura brasileira” única.
Com isso, medidas como a criação da lei de rádios e a Voz do Brasil tornam essa ideia de massificar uma identidade única como política da gestão. No segundo período das políticas culturais, temos toda a época marcada pela ditadura militar, composta de repressão e estruturação de organizações burocráticas que ajudavam no controle.
Logo em seguida, vindo a partir do processo de redemocratização, o governo Sarney (1985-1990) implementa medidas como a criação do Ministério da Cultura e a primeira Lei de Incentivo à Cultura (Lei Sarney).
Esse é o marco de início das políticas culturais no âmbito federal que visam o fomento e incentivo à produção cultural no país. Porém, as gestões têm visões muito diferentes quanto ao tratamento da pasta, passando por uma montanha-russa de entendimentos, levando a uma falta de continuidade das políticas.
O que nos leva a um novo período, caracterizado por três diferentes entendimentos.
O primeiro, representado pelo governo Collor, extingue o então Ministério da Cultura e a lei de incentivo, não investindo nada no setor até o momento que se propõe a reforma da legislação, criando assim a Lei Rouanet – batizada desta forma em homenagem a Sérgio Paulo Rouanet, diplomata que implantou a lei quando foi Secretário da Cultura na presidência de Fernando Collor (1990-1992).
Essa lei, vigente até hoje, marca a consolidação do modelo de mecenato, que torna protagonista as empresas como principais apoiadoras dos agentes culturais no país, em troca de incentivo fiscal.
Segundo Albino Rubim, pesquisador do CNPq e do Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura e professor do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da UFBA, no artigo “Observações acerca das relações entre estado e cultura”, a lei “atribui ao mercado poder decisivo na definição do fomento à cultura no país, mesmo quando a maior parte dos recursos tem origem pública”.
Essa medida leva o governo a abdicar de seu poder de decisão sobre as políticas públicas, delegando às empresas o papel de escolha sobre qual projeto será apoiado e com isso, tende-se a um processo de mercantilização da cultura, onde projetos com apelo midiático tem maior facilidade em captar recursos.
Essa medida leva o governo a abdicar de seu poder de decisão sobre as políticas públicas, delegando às empresas o papel de escolha sobre qual projeto será apoiado e com isso, tende-se a um processo de mercantilização da cultura, onde projetos com apelo midiático tem maior facilidade em captar recursos.
O segundo entendimento, representado pelos governos Itamar-FHC, leva a uma reorganização da parte estrutural da cultura, com a volta do status de ministério para a pasta e uma pequena reforma da Lei Rouanet, incentivando ainda mais a participação da iniciativa privada; essa seria a consolidação do modelo de políticas públicas de produção e presença do mercado.
Já o terceiro entendimento trata principalmente do governo Lula, com apenas a continuidade colocada pelo governo Dilma, “uma agenda mais rica se colocou: orçamento maior, ampliação do quadro funcional, financiamentos do BNDES e uma decidida orientação de dar ao Ministério da Cultura (MinC) uma ação socialmente mais inclusiva e mais voltada às culturas populares”, como afirma José Carlos Durand no livro Política Cultural e Economia da Cultura (Ateliê Edutorial, 2013. 184 págs.).
Além de um planejamento a longo prazo para as políticas culturais (visando justamente acabar com a montanha-russa idearia). Para isso, elaborou uma série de conferências de cultura no país todo, instituiu o Plano Nacional de Cultura junto do Sistema Nacional de Cultura, estes com planejamento para dez anos de gestão.
Se buscou com isso, e está enraizado na alma do plano, uma maior descentralização da gestão cultural, para que cada região trate de seus próprios contextos, não tendo assim uma visão única de como lidar com a cultura do país (via pontos de cultura e a descentralização de recursos pregada pelo Plano Nacional, por exemplo).
Esse é o primeiro artigo falando sobre políticas culturais, sejam elas municipais, estaduais ou federais. O foco será o município, porém, sem o contexto amplo fica difícil entender o que acontece nas esferas menores, principalmente pela legislação municipal ser em maioria reflexo da legislação federal.
* Rafael Perich, 24 anos, é natural de Irati-PR. Passou por diversas faculdades até se encontrar em ciência política.
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