“La muerte es una vida vivida. La vida es una muerte que viene.” Assim dizia o escritor argentino Jorge Luis Borges. A morte, assim como a vida, é apresentada em ritos. Neste processo, vamos da incompreensão à incredulidade. Bem assim, na morte tal qual na vida. O ser humano não surgiu para ser só, para estar só. Do medo vem a reflexão. No outro procuramos nós, ou mesmo um porto. Inevitavelmente, a morte e a vida começam no mesmo instante, são indissociáveis.
“La muerte es una vida vivida. La vida es una muerte que viene.” A lógica de Borges é posta à prova em cena, diante de um público que também encara a batalha de viver frente a verdade única dos fatos cotidianos: a morte é inevitável. Bastaria então ao ser humano a missão de caminhar na passarela da forma mais elegante (e decente!) possível. Voltamos ao início. No escuro, com apenas uma luz central e um jogo cênico em que os atores se alternam entre dois personagens (ou seriam mais, tamanha a complexidade da vida e da morte?), Depois, peça escrita por Marcelo Bourscheid e dirigida por Alex Wolf, e apresentada pelo Grutun! durante o Fringe, no Festival de Curitiba, traz à luz a tensão entre vida e morte, um embate entre a solidão da primeira e a estabilidade da segunda.
Sob o impacto da ausência, somos pegos refletindo. Em cena, os atores correm, para a luz ou da luz, antecipando encontros que não se concretizam para além da efemeridade proporcionada pela vida, aqui, representada ironicamente pela morte. Os rostos se insinuam com a luz, que procura atrair para o centro em uma nova metáfora: uma lâmpada ao ser acessa ou apagada parte do mesmo núcleo central. Estabelecemos, então, (mais) uma relação entre vida e morte, entre a urgência e a fragilidade da permanência.
Em cena, os atores correm, para a luz ou da luz, antecipando encontros que não se concretizam para além da efemeridade proporcionada pela vida, aqui, representada ironicamente pela morte.
Mario Quintana disse: “Morrer, que me importa? (…) O diabo é deixar de viver.” E o diabo que queremos morrer! Recorremos a todas as possíveis tentativas de permanecer, abrindo o convite a uma simples xícara de café, enquanto nosso corpo segue a se atrofiar, se recolher. Inevitavelmente seremos colocados diante da dicotômica existência, e seremos movidos pelos ritos: primeiro, o de viver, de fazer nossa presença perante este universo ter significado (uma busca filosófica incessante); segundo, o de aceitar o inevitável, desapegar do que não nos pertence para além do instante em que nos sentimos vivos.
Depois não se propõe a fazer o espectador valorizar a vida, nem é pretensiosa em apontar valores, fazer juízos ou definir rumos. O texto de Bourscheid pede, apenas, reflexão. E em momentos tão conturbados, refletir é viver mais do que a enganação permite. É perpetuar um pensamento indissolúvel no tempo. Ao fim do espetáculo, é certo que “há mais tempo que vida”.