Chega a Curitiba, no dia 19 de setembro, para uma curta temporada de três dias, no palco do Guairão, o espetáculo Elis, a Musical. Com texto de Nelson Motta e Patrícia Andrade, e direção de Dennis Carvalho, o espetáculo reconstitui a trajetória pessoal e artística da cantora gaúcha, que morreu aos 36 anos, em 1982. Desde o início de sua carreira, no início da década de 60, em Porto Alegre, até o desfecho trágico, o musical recorre a muitas das canções que fizeram da artista uma das maiores vozes da música popular brasileira de todos os tempos.
Já assistido por 200 mil espectadores no Rio de Janeiro e em São Paulo, com inúmeras sessões lotadas, o espetáculo, apesar de suas quase três horas de duração, tem enorme comunicação com o público, que o aplaude em cena aberta em diversas cenas, muito por conta da estrutura narrativa.
A ação é costurada pelas músicas, que por vezes se inserem na ação de forma mais orgânica e realista, reconstituindo momentos-chave da carreira de Elis, como a vitória, com “Arrastão” (de Vinicius de Moraes e Edu Lobo), no 1.º Festival de Música Popular Brasileira da TV Excelsior, em 1965. Ou o programa O Fino da Bossa, apresentado ao lado de Jair Rodrigues, na mesma época. Mas as canções também assumem o papel de falas, ou de manifestações das subjetividades dos personagens, em números bastante inventivos.
Mas o êxito de Elis, a Musical, sem desmerecer a eficiência do texto, muito bem alinhavado, ou a direção eficiente de Carvalho, deve-se, principalmente, ao brilho de sua protagonista, a atriz baiana Laila Garin. Escolhida em um processo seletivo que envolveu cerca de 200 candidatas, ela dá alma ao espetáculo.
Intuição
Em entrevista concedida no último fim de semana de apresentações da temporada paulista do espetáculo, em julho passado, Laila conversou com a reportagem da Gazeta do Povo em seu camarim no Teatro Alfa.
À primeira vista, ela nada tem de parecido com Elis, além, talvez, da baixa estatura. Os cabelos são aloirados, bem crespos e os olhos, impressionantemente verdes. À medida que vai recebendo a maquiagem, e algumas camadas de perucas e apliques, que serão retirados ao longo do primeiro ato da peça, e lentes de contato castanhas, ela vai se transformando na cantora gaúcha.
Mas o grande achado da interpretação de Laila é não ter recorrido à imitação. Ela conta que a produção do espetáculo lhe deu muito material sobre a cantora para ler e ouvir, e, sobretudo para entende-la em sua essência. “Elis não era falsa, era muito visceral. Procurei senti-la o mais intuitivamente possível. Não procurei aprender a cantar como ela, mas entender como ela cantava. Acho que a personagem é uma mistura de mim com ela.”
Julgando-se mais uma atriz que descobriu o canto como forma de expressão do que uma cantora, apesar de ter pleno domínio da técnica vocal, Laila foi escolhida, após o longo processo seletivo, quando interpretou, na audição final, “Fascinação”, uma das canções mais emblemáticas do repertório de Elis.
A repercussão de seu desempenho foi instantânea, medida pelas ovações que recebeu do público desde a estreia do espetáculo, no Rio de Janeiro. E pelos elogios da crítica. Em seguida, vieram os prêmios, entre eles o Shell (melhor atriz) e o Cesgranrio de Teatro (melhor atriz de musicais).
Os papéis de Ronaldo Bôscoli e Cesar Camargo Mariano, os dois maridos de Elis, são interpretados por Tuca Andrada (“herdado” de Felipe Camargo, que fez a temporada carioca do espetáculo) e Claudio Lins, respectivamente.
Andrada, que já havia interpretado o papel-título no musical Orlando Silva, o Cantor das Multidões, que ele mesmo produziu e lhe rendeu alguns prêmios, conta que, para se preparar, leu as biografias Furacão Elis (de Regina Echeverria), A Bossa do Lobo – Ronaldo Bôscoli (de Denilson Monteiro) e a autobiografia Elas e Eu.
Claudio, filho de Ivan Lins, compositor de muitos dos maiores sucessos de Elis, como “Madalena”, conta que tinha apenas 9 anos quando a cantora morreu, mas se lembra da sensação de pesar em sua casa. “Eu sabia que ela era alguém muito próximo, mas só aos poucos fui compreendendo as dimensões da perda.”