Grace de Mônaco, uma produção feita nos Estados Unidos, Bélgica, França e Itália, já mostrava sinais de fragilidade antes mesmo de ser finalizado. Dirigido pelo francês Olivier Dahan, o longa, que estreia hoje nos cinemas brasileiros, sofreu com brigas nos bastidores entre o diretor e o produtor Harvey Weinstein, que insistia em alterar a versão final do produto. Exibido na abertura do 67º Festival de Cannes, fora da competição em uma sessão para imprensa, o filme foi massacrado pelos presentes, recebendo algo pior do que vaias, mas risos constrangedores.
Planejado inicialmente para o cinema, Grace de Mônaco precisou se contentar com sua exibição no canal a cabo americano Lifetime, que já não tem lá uma boa reputação. Assim, foi com curiosidade que fui assistir ao tão falado e desastroso longa que contava a história da princesa de Mônaco e sua aparente vida feliz, após se casar e se tornar uma das mulheres mais nobres do mundo. Não raro eu costumo gostar de determinados filmes que a crítica mais conservadora detesta (aconteceu algo parecido com Obsessão, em 2013), mas, infelizmente, a conclusão é de que os risos constrangedores tinham razão de existir. Grace de Mônaco tem alguns bons acertos, mas são ofuscados por um melodrama confuso, apático e pretensioso.

Grace de Mônaco começa quando Grace Kelly (Nicole Kidman) termina de filmar sua última cena no set de Alta Sociedade. Depois das filmagens, Grace se casa com o príncipe Rainier III (Tim Roth), algo que foi considerado um conto de fadas da vida real, em 1956. Cinco anos após o casamento e com dois filhos, Grace aparenta felicidade para a sociedade, mas está insatisfeita com a vida no palácio, além de sofrer com o distanciamento do marido. A chance de novamente voltar a viver como antes surge quando seu amigo, o diretor Alfred Hitchcock (Roger Ashton-Griffiths), a convida para retornar ao cinema como protagonista de seu próximo filme, Marnie – Confissões de Uma Ladra. O problema é que Rainier é terminantemente contra e, ainda por cima, está envolvido em uma ameaça vinda do presidente francês Charles de Gaule (André Penvern): caso Mônaco não pague impostos à França e acabe com o paraíso fiscal existente, o principado será invadido em seis meses. Em meio às inevitáveis tensões, Grace e Rainier buscam resolver seus problemas, tentando evitar o divórcio, algo inadmissível na época.
Nessa confusão, o filme não retrata nem o casamento, nem a postura de Grace frente ao seu marido e ao povo de Mônaco, parecendo uma versão um pouco mais séria de algum filme da Disney.
A ideia de produzir um filme sobre Grace Kelly era mais do que justificável e o argumento do longa, interessante até certo ponto, tenta fazer um paralelo entre a antiga vida da princesa em Hollywood e sua vida em Mônaco. Porém, o diretor não tem o mesmo talento de Sofia Coppola (Maria Antonieta) parar criar um filme biográfico inteligente e acaba abusando de recursos pobres, em um roteiro confuso que prejudica até mesmo a atuação de bons atores. Mesmo com Dahan declarando em diversas entrevistas que o projeto não é biográfico, ele derrapa ao tentar fixar na cabeça do público que o maior papel da vida de Grace foi interpretar sua vida real, assim como a forçação de barra ao afirmar que a atriz acabou salvando Mônaco de um iminente fim.
Permeado por uma riqueza de cenários, figurinos, belas paisagens e um luxo absurdo (os únicos acertos que realmente chamam a atenção), o roteiro sofre de uma narrativa frágil que ofende até o menos exigente telespectador. Há sempre uma indecisão perceptível para se mostrar, de fato, um conto de fadas ou um olhar mais amargo e real do que seria a vida de uma princesa e seus sacrifícios para salvar o microestado da França e sua família. Nessa confusão, o filme não retrata nem o casamento, nem a postura de Grace frente ao seu marido e ao povo de Mônaco, parecendo uma versão um pouco mais séria de algum filme da Disney. A trilha sonora entra praticamente em todas as cenas, sempre exageradas, pomposas, irritantes, como se o diretor não confiasse em sua própria câmera. Há, também, uma tentativa estranha de recriar o estilo de Hitchcock de filmar, algo que poderia ser interessante, mas que apenas reforça a estranheza do projeto, já que, no decorrer do longa, esse recurso é esquecido.

Ao tentar emular a aparente elegância de uma vida de princesa, Grace de Mônaco acaba sendo nada sutil, caminhando para o melodrama barato a cada minuto. Grace chora e sai correndo para se jogar na cama; Grace é oprimida pelo marido; Grace enfrenta a sociedade, mas decide ficar ao lado do marido para conseguir sua aprovação. Tentando apagar a imagem de “princesa feliz para sempre”, o longa apenas reafirma esterótipos, cometendo o pior dos pecados em uma narrativa. No final, Grace não parece ter evoluído significativamente, voltando quase que exatamente ao ponto onde começou.
As atuações tampouco empolgam. Não entrando no mérito da idade de Grace Kelly retratada no filme e a idade de Nicole Kidman, a atriz aparece ora engessada, ora exagerada, ora sem expressão, nunca encontrando o tom. A câmera passeia pelo seu rosto em close, um recurso forçado que não encontra justificativa nenhuma a não ser tentar mostrar alguma grandiosidade em sua atuação, garantindo indicações em prêmios. Tim Roth também não aparece muito a vontade, limitando-se a uma atuação desanimada.
É uma pena que um telefilme que poderia ser definitivo seja tão esquecível. Sua indicação ao Emmy, aliás, acontece mais pela quesito técnica e pelo peso do nome de Nicole Kidman do que propriamente por ser um bom filme. Infelizmente, o excesso de açúcar e a superficialidade romântica da trama cansam e não convencem. Pecando justamente ao não conseguir transpor para a tela a pessoa admirável que Grace Kelly foi, o filme entrega uma história que não encanta. Ao humanizar uma vida palaciana, Grace de Mônaco acaba mostrando que a vida de uma princesa pode ser tediosa.