O que é possível dizer sobre Hokuto no Ken? Baseado em um dos mangás mais populares de todos os tempos e produzido pela Toei Animation, a série foi exibida pelo canal japonês Fuji Television Network entre 1984 e 1987, e foi pioneiro em uma nova forma de se fazer animes de ação, que veio a ser exemplo para obras como Cavaleiros do Zodíaco, Dragon Ball Z, Berserk e JoJo’s Bizarre Adventure.
E o que esta série possui de especial? Vamos analisar abaixo.

Com um estilo profundamente inspirado em Mad Max e, principalmente, Mad Max 2, Hokuto no Ken (traduzível como “Punho da Estrela do Norte”) é ambientado no ano 199X, como a narração inicial de todo episódio explica, em um mundo pós-apocalíptico resultante de uma guerra nuclear que devastou a maior parte da humanidade e transformou a Terra em um deserto aparentemente sem vida.
Embora alguns sobreviventes tentem reconstruir a sociedade e formar pequenas comunidades, estas são sempre ameaçadas por bandos de motoqueiros punks selvagens (de cabelo moicano, roupa de couro e tudo), muitas vezes liderados por artistas marciais tão absurdamente gigantescos e/ou musculosos que algumas sinopses inclusive os descrevem como mutantes (por mais que o anime nunca diga isso; eles simplesmente são assim). Estes bandos atacam as comunidades ora para saquear o que resta de água e comida, ora para escravizar os mais fracos, ou pela simples diversão de matar pessoas inocentes.

Se você algum dia se perguntou como seria se as pinturas de Frank Frazetta fossem uma série animada, aqui está sua resposta.
É nessa era que surge, então, nosso personagem principal, Kenshiro, também conhecido como Ken. Sucessor de uma antiga e mortal arte marcial chamada Hokuto Shinken, ele defende os fracos de todo tipo de malfeitor, a partir de um intrincado sistema de técnicas que usa os pontos vitais de seus oponentes para destruí-los de dentro para fora, ou então para fazer coisas como desfigurá-los e até obrigá-los a falar a verdade. Devido a isso, Ken é um herói quase imbatível… Quase, porque como é revelado no começo da série, no passado ele foi quase morto por outro artista marcial chamado Shin, que ainda por cima sequestrou também sua namorada, Yuria.
A princípio, o enredo parece ser apenas sobre Ken procurando por Yuria junto com uma dupla de crianças, e de fato a primeira temporada é basicamente isso. Quando a história começa a parecer fraca, porém, a série se torna muito mais, introduzindo diversos novos personagens, como Rei, outro artista marcial capaz de fatiar seus inimigos com os dedos; e, principalmente, os irmãos de Ken, todos adotados pelo antigo mestre do Hokuto Shinken para decidir quem seria seu sucessor.
Alguns deles, porém, têm raiva de Ken por ele ter sido o escolhido e, portanto, tentam matá-lo; principalmente o mais velho e ameaçador deles, Raoh, que inclusive matou seu mestre antes de deixar a escola. O que parece um mero conflito familiar, porém, escala para proporções dignas das melhores histórias de fantasia, uma luta de Kenshiro, o “Salvador do Novo Mundo”, contra aqueles que pretendem governá-lo.

Ao longo dos anos, a série manteve um culto bastante fiel de fãs ao redor do mundo, e é fácil perceber por que: para o bem ou para o mal, Hokuto no Ken é exageradamente violento, com as lutas assumindo um nível de brutalidade nunca antes visto em animação; não há um único episódio sem que alguém tenha a cabeça explodida ou seja feito em pedaços. Junte isso a doses homeopáticas de humor japonês e certa quantidade de insinuações homoeróticas – especialmente na segunda temporada – e você tem uma série com um estilo bastante único e que, se for para descrever em um único adjetivo, seria “exagerado”.
As lutas são exageradamente sanguinolentas, os vilões são exageradamente cruéis, os personagens são exageradamente musculosos, Kenshiro é exageradamente sério, os diálogos são exageradamente dramáticos – quase teatrais, pode-se dizer -… Se você algum dia se perguntou como seria se as pinturas de Frank Frazetta fossem uma série animada, aqui está sua resposta – embora pouco animadas, é preciso infelizmente constatar, uma vez que mais dinheiro foi gasto na arte final do que na fluidez da animação. Isso, porém, é compensado por uma combinação perfeita de arte final detalhista e trilha sonora marcante, dando à série um ar épico mesmo quando pouco acontece.
Mas de uma forma curiosa, esse exagero todo funciona a favor da série, pelo simples motivo de que combina perfeitamente com a ambientação do enredo: o mundo pós-apocalíptico de Hokuto no Ken é um deserto sombrio e árido, em que o simples ato de viver pode ser um pesadelo se você não for forte. Assim como nos melhores filmes de Mad Max, este é um mundo que simplesmente “enlouqueceu”, e ser louco e desvairado é quase a norma – portanto, não há excesso que não soe apropriado. E é neste mundo louco que aparece Kenshiro, cercado de uma aura messiânica, acabando com a raça daqueles que se acham no direito de torturar os mais fracos, sempre repetindo sua frase de efeito, uma das mais famosas dos animes: “Omae wa mou shindeiru” (“Você já está morto”).