A cena é rápida. Cruel. Quase seca, como uma martelada que a câmera não suaviza. Joel está morto. Assim, de repente. No segundo episódio da segunda temporada da série The Last of Us, da HBO. E mesmo que a gente já esperasse por isso – os jogos já haviam nos preparado, os rumores também -, a série consegue fazer com que esse momento nos atinja como se fosse a primeira vez. Como se fosse pessoal.
“Through the Valley”, título do episódio, parece uma referência bíblica, um caminho sombrio por onde Ellie (Bella Ramsey) é forçada a andar, sozinha, depois de perder sua âncora. E a dor que se instala ali não é daquelas que choram alto. É mais como um peso no peito, uma presença ausente que a série, com inteligência, decide não preencher. Joel se vai, e tudo o que vem depois é sombra dele.
Dói porque Pedro Pascal criou um personagem impossível de ignorar. Um homem falho, marcado, violento, mas que – à sua maneira – foi abrigo. E o que resta para Ellie, agora, é o eco das decisões que ele tomou. Porque, nesse mundo apodrecido pela infecção, ninguém morre sozinho. As escolhas de um pai postiço se tornam os fantasmas que a filha terá de carregar.
A série parece nos dizer: crescer, aqui, é virar monstro. Mas também sugere que talvez, só talvez, exista outra saída.
O episódio tem essa coragem de bagunçar tudo. E não só pela perda. Há uma invasão em Jackson que parece saída de uma era medieval – muros, tochas, desesperos. E ali, no meio do caos, uma jovem mulher corre por sua vida. Abby (vivida por Kaitlyn Dever) é apresentada de forma intensa, cruel, quase cruel demais. Não é fácil gostar dela. E não é pra ser.
A série sabe disso. E joga com esse desconforto.
Dever ainda está encontrando o tom, e talvez isso torne Abby mais difícil de engolir agora. Mas há algo nela – um olhar perdido, uma raiva mal resolvida – que aponta para uma complexidade que ainda virá. Não é uma vilã. Ou, pelo menos, não só. É alguém tentando viver depois de uma perda – como Ellie.
E é isso que mais me pegou nesse episódio. A maneira como The Last of Us insiste em mostrar que, nesse mundo, ninguém sai ileso. Que a vingança, o luto, a memória – tudo isso é matéria viva, e não desaparece com o tempo. Ellie não chorou. Não gritou. Mas a forma como ela olha o corpo de Joel, imóvel, revela tudo. A dor está lá. Silenciosa. Assustadora.
A série parece nos dizer: crescer, aqui, é virar monstro. Mas também sugere que talvez, só talvez, exista outra saída. Ellie está cercada por pessoas que ainda veem nela algo bom -Tommy, Dina, Jesse. Talvez eles sejam sua chance de não repetir o ciclo.
Mas por enquanto, o que resta é o vazio.
A ausência de Joel é um buraco que ninguém vai preencher. E tudo o que ele deixou para trás – suas decisões, suas culpas, seus segredos – agora pesam sobre Ellie como um fardo. Um legado que ela não pediu, mas que vai ter que carregar.
Esse episódio me deixou sem fôlego. E não foi pela ação, pela violência ou pelo susto. Foi pela tristeza muda que se instala nos minutos finais. The Last of Us continua sendo uma história sobre monstros, sim. Mas também é, acima de tudo, uma história sobre amor. E como amar, nesse mundo, sempre cobra um preço.
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