Comentei, no ano passado, que o programa Canta Comigo, da Record, era, provavelmente, o melhor reality musical exibido nos últimos anos na TV brasileira. Ainda que tenhamos um verdadeiro fascínio por competições musicais (pelo menos desde o tempo do Show de Calouros do SBT), o fato é que essas atrações costumam soar muito repetitivas. O formato do Canta Comigo encanta justamente pela simplicidade: é menos uma competição muito sério e mais um momento cativante em que uma “plateia” de jurados se empolgam (ou não) com algum candidato. Justamente por ser despretensioso, Canta Comigo era uma delícia.
Aconteceu, no entanto, uma tragédia na trajetória do programa: a morte do apresentador Gugu Liberato, cuja alegria trazia a alma para a atração da Record. Infelizmente, Gugu só teve tempo de encabeçar uma temporada do programa, que ficou em stand-by até a emissora decidir o que faria com ele.
Neste domingo, chegou a resposta: o programa ganhou uma versão teen, em que os competidores têm no máximo 15 anos, como um grande quadro dentro do Hora do Faro, programa do apresentador Rodrigo Faro. Eles se apresentam, que nem os adultos, para um paredão de 100 avaliadores – basicamente, os mesmos que estavam na versão original do programa. A julgar pelo primeiro episódio, eles prometem fazer o mesmo tipo de julgamento que faziam no ano passado, sem poupar as críticas porque se tratam de adolescentes. Isso é um fator positivo do Canta Comigo Teen.
A grande graça do Canta Comigo é cantar junto com o repertório – na maior parte do tempo, composto por músicas antigas, que mais remetem à idade dos jurados do que dos cantores.
Mas é claro que substituir Gugu não é tarefa fácil. Rodrigo Faro, afinal, é de fato corajoso, pois as comparações são inevitáveis. O desafio, além de capitanear um programa que se fundamentava justamente no carisma de Gugu, é o de se adaptar a uma linguagem voltada para esse público infantojuvenil.
Pelo que vimos no primeiro programa, Faro pretende trazer a sua persona engraçadona, um pouco em baixa atualmente – me parece que ele se tornou uma espécie de Marcos Mion de segunda linha, já que o apresentador de A Fazenda soa mais espontâneo em sua personagem. No Canta Comigo Teen, ele soa sempre meio over.
Faro tentou ser fofo, dizendo várias vezes que queria abraçar as crianças, mas não podia, por causa da pandemia. Em um momento um tanto forçado, em que uma menina cantou Beyoncé, ele ensaiou uns passos da cantora, remetendo ao quadro “Dança, gatinho”, do programa Hora do Faro, em que se veste de alguma celebridade e faz uma imitação. Tentou, afinal, trazer algum humor um tanto datado – remetendo ao tempo em que esse quadro ainda tinha alguma graça.
No resto, o formato continua mantendo a mesma essência. A grande graça do Canta Comigo é cantar junto com o repertório – na maior parte do tempo, composto por músicas antigas, que mais remetem à idade dos jurados do que dos cantores. Neste primeiro episódio, por exemplo, os adolescentes performaram Cindy Lauper, a música tema do filme Footloose, de 1984, e “História de uma gata”, do álbum Os Saltimbancos, de Chico Buarque. Soa muito estranho imaginar que todos os candidatos (que nasceram, no máximo, em 2005) tenham escolhido essas músicas por livre e espontânea vontade.
Ainda assim, mesmo com a ausência sentida de Gugu, o programa continua divertido e contagiante. E a razão principal é que é um reality show musical infantojuvenil, mas que não parece um reality show musical infantojuvenil. Não por acaso, a apresentação mais bem avaliada na tarde foi a de um menino cuja voz grave não parecia ser de criança. E isso diz muito sobre esse tipo de atração.