O medo do escuro é um dos mais primitivos que o ser humano carrega. Tudo parece mais perturbador quando nos é invisível, quando não vemos o que vamos enfrentar. Santo, série espanhola original Netflix, com Bruno Gagliasso no elenco, tem o desconhecido como um dos pontos centrais da trama.
Criada por Carlos López, mas dirigida pelo brasileiro Vicente Amorim, que atualmente conduz a minissérie que contará a trajetória do piloto brasileiro Ayrton Senna, o seriado é um amálgama de gêneros, que vive em uma linha tênue que tenta agregar o suspense, drama e terror.
No seriado, Gagliasso é Cardona, um policial que deseja capturar o narcotraficante conhecido pelo apelido de Santo, cuja identidade todos desconhecem.
No entanto, o policial brasileiro não está sozinho nessa, do outro lado do Atlântico, o policial Millán (Raúl Arévalo) também vive atrás do maior traficante mundial de cocaína.
Entre Madri e Salvador, na Bahia, o único vínculo que ambos têm com Santo é Bárbara (Victoria Guerra), uma misteriosa mulher de origem portuguesa, amante do traficante, que vive no universo espiritual e violento do criminoso.
Se a premissa é interessante e a série é bem produzida, quais os problemas que a tornam problemática? Há algumas opções que não foram certamente as melhores.
A primeira seria as linhas do tempo intermitentes: é bastante confuso acompanhar e conectar as informações que nos são dadas. Cabe ao espectador conectar os fios da trama, e além de exigir, não deixa claro se há algo fundamental a ser descoberto que exija essa dedicação do espectador.
Um segundo ponto complicado é como as transições de gênero embaçam o desejo do roteiro: descobrir quem é o Santo? Acompanhar a jornada dramática e de extenso sofrimento psicológico dos protagonistas?
Apesar de Santo ter uma estética super carregada de símbolos, densa e obscura, seu enredo não é caricato, recheado de visões colonizadoras e clichês sobre o Brasil.
Santo começa e se prolonga pelos 8 episódios da primeira temporada em ritmo alucinado. Essa escolha impacta diretamente em um poder fundamental que os grandes dramas têm: serem meticulosos.
As diferentes ramificações criadas pelo cruzamento de linhas temporais distintas, essencialmente entre Brasil e Espanha, também esvaziam de poder a trama tão carregada de simbolismo.
Por fim, retira o que liga passado e futuro: como Cardona e Millán se tornaram tão quebrados? Como foram ser esgotados por esse poder que é o narcotraficante?
É elogiável, no entanto, o tratamento dado à fé. Um conselheiro religioso especializado em cinema foi contratado para as filmagens, assessorando a equipe no processo de elaboração do roteiro preliminar e na pós-produção.
Isso fez com que, apesar de Santo ter uma estética super carregada de símbolos, densa e obscura, seu enredo não fosse caricato, recheado de visões colonizadoras e clichês sobre o Brasil.
É tarefa difícil chegar a um veredito final sobre Santo, porque, apesar de seus problemas, algumas sequências são tão bem feitas (em termos de roteiro, fotografia e direção de arte), que o espectador segue diante da tela.
Muitos ganchos são deixados ao fim da primeira temporada de Santo. Resta saber se Carlos López terá oportunidade de seguir com sua empreitada por mais capítulos. Pelo histórico recente da Netflix, é bom rezar para todos os santos.
ESCOTILHA PRECISA DE AJUDA
Para continuar a existir, Escotilha precisa que você assine nosso financiamento coletivo. Você pode contribuir a partir de R$ 8,00 mensais. Se preferir, pode enviar um PIX. A chave é pix@escotilha.com.br. Toda contribuição, grande ou pequena, potencializa e ajuda a manter nosso jornalismo.