O fim de Ted Lasso após sua terceira temporada foi uma decisão que tirou o chão dos fãs, mas, passadas algumas semanas da exibição do episódio final, parece ter sido a escolha acertada. A série retornou para seu crepúsculo com um pouco de dificuldade, mas seu fim entregou a mesma magia e charme que conquistaram o coração do público desde seu início.
Os episódios finais da série ofereceram aquela comédia reconfortante que fez a audiência sorrir e escapar para um universo onde a gentileza e o otimismo predominam – o que também resultava em desgosto de uma parcela das pessoas. Nenhum fim é simples, mas Ted Lasso presenteou seus fãs com o desenvolvimento dos personagens, aprofundando suas jornadas e desafios pessoais – novamente, um aspecto que criou fãs e detratores.
Sob o ponto de vista analítico, é evidente que uma das maiores qualidades da terceira temporada de Ted Lasso foi o crescimento de seus personagens, especialmente os coadjuvantes – mas não apenas. Ted, interpretado de forma carismática por Jason Sudeikis, enfrentou dilemas emocionais que o fizeram não mais poder evitar refletir sobre sua saudade de casa.
O roteiro deu ao protagonista da série um arco bastante humano e comovente. A evolução de Ted foi bastante genuína, levando-o além de sua persona de treinador, apresentando camadas mais profundas de vulnerabilidade e reflexão.
Todavia, não foi apenas o carismático treinador que teve espaço para crescer nesta terceira e última temporada. Nate, que antes era o tímido e reservado assistente e sem grandes explicações (talvez o único furo em toda a série) virou um arrogante técnico, enfrentou questões de insegurança que lhe trouxeram consequências.
Mas o roteiro de Phoebe Walsh (que também atuava como a namorada do treinador Beard) permitiu a Nate uma evolução consistente e com uma abordagem mais realista sobre a natureza complexa das pessoas. O mesmo podemos dizer sobre a Rebecca de Hannah Waddingham, cuja interpretação magnífica fez de seu arco narrativo uma busca frequente por redenção. Não à toa, é outra personagem que precisou enfrentar seu passado – e um universo dominado por homens, diga-se de passagem.
Não é apenas futebol
Os assuntos puderam ser tratados com naturalidade, sem didatismo – o que, convenhamos, não era a função da série.
Uma das frases ditas com mais frequência por amantes do jogo é que o esporte não se trata apenas de futebol. O seriado levou essa máxima para a tela em todas as temporadas, mas de forma muito especial nesta última. A homossexualidade de Colin (Billy Harris), tema delicado e ignorado nos campos da vida real, foi abordada em episódios. A tratativa se esforçou em dar um tom natural, isto é, sem que fosse um bicho de sete cabeças – o que, torcemos, deve ser a tônica do futebol.
A xenofobia enfrentada por Sam Obisanya (Toheeb Jimoh) também teve espaço, assim como a violência e abandono parental (e seus impactos) na vida de Jamie Tartt (Phil Dunster) e o vazamento de fotos íntimas de Keeley (Juno Temple).
Pode-se criticar que os temas foram abordados sem a devida complexidade. No entanto, a escolha deu fluidez à narrativa. Os assuntos puderam ser tratados com naturalidade, sem didatismo – o que, convenhamos, não era a função da série. Ao fim e ao cabo, a decisão parece ter sido a melhor.
‘Ted Lasso’: uma fórmula bem-sucedida

A temporada final de Ted Lasso soube como poucas vezes se vê nos seriados manter a fórmula de sucesso que tornou a série um fenômeno. Sem tanta pieguice (ainda que eventualmente ela lá estivesse), a comédia aconchegante foi equilibrada por diálogos afiados, em uma busca constante para evitar que o tom fosse excessivamente doce.
Neste aspecto, os roteiristas foram bem ao manter a essência da produção, oferecendo uma história coesa e emocionalmente envolvente, enquanto exploraram novas dinâmicas e desafios para os personagens. O maior espaço a personagens secundários, como o divertidíssimo Trent Crimm, interpretado por James Lance, e a efervescente Katy Wix como Barbara, trouxeram dinamismo e diversão à narrativa.
Não se nega, porém, que mudanças mais ousadas na trama, ou reviravoltas surpreendentes, tenham ficado de fora, causando certa frustração em alguns telespectadores. Ou seja, o programa optou deliberadamente por não se arriscar em termos de desenvolvimento narrativo.
Acontece, e essa é uma constatação, creio, bastante óbvia, que Ted Lasso foi concebida como um lugar para enaltecer o encanto e a gentileza, oferecendo uma mensagem inspiradora de esperança, empatia e positividade em um mundo (o real) tão tomado pelo caos. E para isso, seu universo semanal particular fará bastante falta.
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