Dificilmente você verá alguém afirmando que a HBO cometeu um erro. É raro, difícil, mas acontece. E se há algo que costuma ocorrer nestes raros momentos é assistirmos a emissora “errar feio, errar rude”, como diz o meme.
Vice Principals surgiu na grade da emissora como uma grande aposta. Criada pelo ator Danny McBride (famoso pela série Eastbound & Down) e pelo diretor Jody Hill (criador da mesma Eastbound & Down), o show foi anunciado como uma série que conteria em sua primeira temporada 18 episódios. Com alguns percalços ao longo da produção, a série foi dividida em duas temporadas de 9 episódios cada, tendo a primeira parte deles encerrado em setembro do último ano – a segunda retorna em julho próximo.
A série tem como centro o mal-humorado, autoritário e antipático Neil Gamby (papel de McBride), vice-diretor da North Jackson High School. Pouco depois da aposentadoria do antigo diretor (interpretado por Bill Murray), Gamby passa a ambicionar o posto. Entretanto, o antigo chefe revela não confiar nele nem no sociopata e intrigante Lee Russell (Walton Goggins), outro vice-diretor da escola. Em virtude disto, ele faz com que outra pessoa assuma o cargo, mais especificamente Belinda Brown (Kimberly Herbert Gregory), mulher, negra, divorciada e ex-alcoólatra.
Inicialmente inimigos, Gamby e Russell veem na presença de Belinda um ponto em comum, de modo que passam a conspirar contra ela para que o corpo docente vete sua nomeação, o que logicamente não ocorre. O que vemos a partir daí é uma destruição gradativa de tudo que cerca a reputação da diretora, trazendo à tona todos os preconceitos escondidos nas personalidades desagradáveis dos protagonistas.
Acusada pela Television Critics Association (Associação de Críticos de Televisão) dos Estados Unidos de apregoar racismo e misoginia, Vice Principals é justamente isso: um programa voltado a fazer humor através de uma trama em que personagens misóginos e racistas fazem de tudo pelo poder. Tudo mesmo.
Belinda só aparece em quadro para ser objeto do ódio acumulado por seus vice-diretores.
É inegável que a construção de Neal Gamby e Lee Russell seja complexa. Ambos são subjugados por mulheres, o que constantemente afeta a frágil masculinidade de ambos. Russell vive com a esposa, Christine (Susan Park) e a sogra, Mi-Cha (June Kyoto Lu), que inferniza sua vida e não perde qualquer oportunidade que tenha para minimizá-lo. Gamby é divociado de Gale (Busy Philipps), com quem tem uma filha. Ela casou novamente com Ray (Shea Whigham), que é o extremo oposto de Neal: forte, aventureiro e amante de esportes radicais. Gale não perde oportunidades de compará-los em frente à filha, o que incute o medo de que Ray passe a ser o modelo de homem para a filha o atormenta. Neste contexto, Belinda surge como uma válvula de escape à dupla, que enxerga na destituição de seu cargo a vingança contra todas as derrotas de suas vidas pessoais.
Ao passar dos episódios, fica evidente que não se trata apenas de uma disputa profissional. Gamby e Russell não aceitam que em seu reino profissional, a escola, uma mulher também seja responsável por ridicularizá-los. E o espectador mais atento notará as nuances preconceituosas. Belinda só aparece em quadro para ser objeto do ódio acumulado por seus vice-diretores. Ainda que haja um episódio que apresenta um pouco melhor sua história, na maioria dos 9 capítulos ela passa o pior na mão dos dois.
O roteiro até tenta em alguns momentos rever o posicionamento de seus protagonistas, como se eles fossem encontram a redenção de seus pecados. Contudo, o resultado não é satisfatório, tornando Vice Principals uma série que não faz rir, mas certamente é campeã em destilar preconceitos.