A primeira mensagem que o espectador de O Escândalo (2020) verá são legendas indicando que a história prestes a ser contada é inspirada em fatos reais, mas com dramatização. Esse pequeno “porém” é bastante significativo. Existe um cuidado evidente em esclarecer que a essência do que será contado aconteceu, mas que detalhes com ares de ficção são inseridos buscando atrair a atenção. Muito provavelmente toda essa preocupação é levada em conta porque o lançamento do filme acontece em um momento no qual tudo está muito vivo, próximo e latente.
O tal escândalo do título em português estourou há pouco tempo, em 2016, ou seja, cerca de três anos antes da chegada da história aos cinemas. Os fatos “explodiram” durante a campanha de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Nesse sentido, muitos dos envolvidos estão aí, convivendo, e coletando as consequências boas – e não tão boas – do que aconteceu.
A trama retrata o caso real da proliferação de denúncias de assédio sexual contra Roger Ailes, o poderoso executivo da rede de TV estadunidense Fox News. Em O Escândalo, ele é interpretado por John Lithgow. Com direção de Jay Roach (que dirigiu filmes como Entrando Numa Fria, de 2000, e Entrando Numa Fria Maior Ainda, de 2004), O Escândalo fundamenta-se na relação de Ailes com o trio Megyn Kelly, comentarista política interpretada por Charlize Theron; Gretchen Carlson, apresentadora vivida por Nicole Kidman; e a produtora Kayla Pospisil, papel fictício interpretado por Margot Robbie. A inserção dessa última personagem é uma das provas da tal dramatização que os letreiros iniciais da obra informam.
Por mais que trabalhe uma situação específica em um país específico, O Escândalo consegue mostrar-se uma obra com viés universal em sua forma de falar de assédio, ambiente de trabalho tóxico e bastidores do poder midiático.
A narração tem ritmo acelerado, com ares de redação correndo para finalizar a edição de um telejornal prestes a ser transmitido. Essa agilidade toda lembra A Grande Aposta (2015). E não é para menos. Os dois filmes têm o mesmo roteirista: Charles Randolph, profissional que enche seus personagens de diálogos que, para serem bem aproveitados, exigem um ritmo muito ágil de gravação e montagem. Randolph também é o roteirista de Amor e Outras Drogas (2010) e A Intérprete (2005).
O roteiro perpassa diversas facetas da história como o conservadorismo da Fox News; a defesa de valores retrógrados no discurso político; a depreciação da mulher por parte do então candidato à presidência Donald Trump; vários conservadores “saindo do armário” enquanto a aceitação de Trump cresce junto à opinião pública; o uso das redes sociais para atacar inimigos; e o ambiente tóxico nos bastidores da Fox News. Um ambiente tóxico que transborda para aquilo que o público vê. Em uma cena emblemática que atesta isso, uma cidadã está fazendo compras em um mercado e depara-se com a personagem de Nicole Kidman. A cidadã aproveita a oportunidade para jogar na cara da apresentadora da Fox News que, em sua opinião, a emissora faz mal aos Estados Unidos.
Em contrapartida, um conjunto considerável de pessoas passa a defender a eleição de Trump como presidente. Esse fenômeno está intimamente ligado com o fato de a Fox News mostrar-se conservadora e, por isso, apoiar a agenda temática do então candidato.
Por mais que trabalhe uma situação específica em um país específico, O Escândalo consegue mostrar-se uma obra com viés universal em sua forma de falar de assédio, ambiente de trabalho tóxico e bastidores do poder midiático. Destaque para a atuação de Charlize Theron que, inclusive, ganhou uma indicação ao Oscar 2020 na categoria “Melhor Atriz”.
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