Entre lives e com direito a muita interatividade, o período de pandemia parece que aqueceu também o lado maléfico do ambiente virtual. Com as pessoas ainda mais conectadas por conta da necessidade de isolamento social imposta pelo coronavírus, a web também caminha para se tornar, de fato, “terra de ninguém” – com linchamentos morais, ataques de ódio, manifestações preconceituosas e, claro, para a proliferação descontrolada das terríveis fake news.
Sem papas na língua ou qualquer melindre, todo tipo de atrocidade é compartilhada e postada. Em meio ao caos político e diante do agravamento da crise na área da saúde impulsionada pela COVID-19, a desinformação, o pânico e a irresponsabilidade reinam absolutos. Quem não tem filtro, compra ideias aleatórias e se torna responsável por dar destaque a conteúdos que só trazem prejuízo e riscos a toda sociedade.
Linchamento virtual
Nesse cenário preocupante e ainda no clima do término da edição 20 do Big Brother Brasil, que alcançou enorme repercussão também devido a esse momento delicado, destaco os problemas vividos pelo participante Victor Hugo Teixeira na fase pós-BBB. O maranhense, de 25 anos, chegou a interromper uma live aos prantos com as ofensas homofóbicas e também relacionadas ao seu peso e forma física proferidas pelos haters de plantão.
Em uma postagem no Instagram, o psicólogo desabafou e fez uma reflexão perturbadora. Ele colocou tudo que construiu em sua vida ao lado dos 50 dias que permaneceu no reality show. O resultado foi uma desconstrução de identidade impressionante: “Durante 9131 dias da minha vida eu: fui ótimo filho, nunca dei trabalho pros meus pais, me esforcei muito para ter todas as notas máximas no meu mestrado na USP, ganhei prêmio de segundo melhor trabalho sobre estresse num congresso internacional, escalei vulcão, construí igreja, compus 111 músicas, montei grupos e quartetos musicais, ajudei refugiados”, entre outras realizações que lista.
Está cada dia mais difícil lidar com a truculência virtual. Fica a dolorosa sensação de que as pessoas estão mesmo dispostas a mostrar o seu pior, já que podem se ‘esconder’ atrás das suas telas. Falta bom senso. Empatia? Sem comentários…
Na sequência, Victor fala como ele enxergou sua participação no BBB: “Um sonho, aprendi, acertei, errei, fugi, enfrentei, me superei, podia ter tido mais equilíbrio emocional e ir mais longe, mas dei meu melhor, viveria tudo de novo, só que fazendo melhor, fiz amizades incríveis”, pondera.
Por fim, ele desabafa sobre como as pessoas julgam sua passagem pela casa mais vigiada do país: “Falso pra caralho, apóstata, pombo, fraco, gordo, vive numa realidade paralela, gay enrustido, assexual de Taubaté, vergonha da comunidade LGBT, da igreja, do Maranhão, dos psicólogos…”, enumera.
Está cada dia mais difícil lidar com a truculência virtual. Fica a dolorosa sensação de que as pessoas estão mesmo dispostas a mostrar o seu pior, já que podem se “esconder” atrás das suas telas. Falta bom senso. Empatia? Sem comentários…
Nunca fomos tão conectados e isolados ao mesmo tempo. Tudo se resolve em um áudio ou mensagem pelo WhatsApp. Em tempos de redes sociais, compartilhamos ilusões, mundos perfeitos e curtimos a solidão, a indiferença e o distanciamento. Por que será?
Antes de encerrar, queria dedicar essa coluna, que chega ao seu 3º aniversário, à trajetória do inesquecível Flávio Migliaccio. Em outro momento, com certeza, vamos recordar do Tio Maneco, do Xerife e de suas participações em programas como o Sítio do Picapau Amarelo. Aos 85 anos, o grande artista decidiu que não dava mais para continuar. Faltam palavras para definir sua partida inesperada. Seguimos lutando e tentando fazer diferente com nossas crianças…