Dias desses sonhei com uma minúscula floresta de eucaliptos que havia perto da minha casa quando eu era criança. A piazada brincava de esconde-esconde por lá ou se reunia para fumar bitucas de cigarro encontradas no chão e beber alguma garrafa surrupiada da estante dos pais. Os meninos mais velhos contavam histórias estapafúrdias sobre gurias que não existiam e encenavam piadas sujas que não entendíamos. Ríamos mesmo assim, ensaiando algum tipo amizade que logo se perderia no tempo.
Aquela mini floresta parecia ser composta por madeira de replantio e a simetria das árvores emprestavam certa artificialidade ao lugar, como se fosse apenas um cenário montado ali para a gente se divertir. A própria presença dela naquele lugar era um pouco absurda, pois ficava no meio de um bairro residencial, ao lado de uma avenida movimentada, feito um tufo de cabelo que o barbeiro esqueceu de cortar.
O cheiro do eucalipto se misturava às nossas conversas enquanto um sol fraquinho de maio tentava atravessar persianas feitas de folhas. Era o nosso lugar secreto, onde éramos felizes e não havia espaço para os pesadelos pessoais que cada um tinha em casa. Enfiados em nossas japonas e nossos bonés de times de basquete americanos, nos achávamos infinitos e mal nos dávamos conta do peso insustentável daquela infância, que aos poucos ia se diluindo e desaparecendo em meio aos galhos e às cascas das árvores no chão.
Aquela mini floresta parecia ser composta por madeira de replantio e a simetria das árvores emprestavam certa artificialidade ao lugar, como se fosse apenas um cenário montado ali para a gente se divertir.
Não demorou para que, ironicamente, uma loja de materiais de construção destruísse o nosso esconderijo. A empresa comprou o terreno e logo apareceram várias máquinas amarelas e barulhentas no expulsando de lá. Chegamos a brincar de nos equilibrar sobre as árvores então horizontais, logo pós a derrubada, mas muros brancos e enormes foram construídos para que o local não parecesse tão absurdo à vizinhança.
Após o sonho que tive, fiquei um bom tempo tentando me lembrar se de fato aquela floresta existiu da mesma forma que eu a guardei na memória. Talvez ela não fosse tão simétrica, talvez fosse povoada por seres peçonhentos e talvez nem ríssemos tanto assim das piadas sujas. Pensei até em ligar para minha mãe e perguntar se ela se lembrava das minhas ausências, das brincadeiras, da roupa suja com cascas de árvore, do meu sorriso, mas preferi continuar com a incerteza.
É que ainda hoje, quando sinto cheiro de eucalipto, lembro-me de uma infância feliz que eu não sei se inventei.