No último domingo encerrei uma jornada muito pessoal de oito anos. Sim, confesso que assisti a todos os episódios de Game of Thrones desde 2011, sempre aos domingos, como se fosse um ritual. Mas não me julgo melhor do que ninguém por causa disso, tampouco incluiria a série no meu top 5.
Mad Men, Breaking Bad e Oz estão lá, firmes e fortes, no topo da minha lista, por terem me proporcionado experiências estéticas, e também emocionais, bem mais intensas e complexas, talvez porque eu tenha uma enorme queda por protagonistas marginais e anti-heroicos, o que não falta a Game of Thrones, diga-se passagem.
Nunca tive, contudo, coragem de escrever uma resenha de Game of Thrones, porque não me considero um fã nerd típico, repleto de referências e capaz de citar de cabeça os nomes de todos os personagens dos Sete Reinos.
Muito cedo, já na primeira temporada, escolhi ser um espectador relapso, desencanado, ainda que fiel à série. Deixei-me mergulhar nas muitas geografias de Westeros, fascinado pelas intrigas palacianas, bem mais atraentes, ao meu ver, do que as espetaculares cenas de batalha.
As intrincadas relações interpessoais, algumas bem perversas, me mantiveram preso à serie. Não sua grandiloquência.
No último domingo encerrei uma jornada muito pessoal de oito anos. Sim, confesso que assisti a todos os episódios de Game of Thrones desde 2011, sempre aos domingos, como se fosse um ritual. Mas não me julgo melhor do que ninguém por causa disso
Enquanto o mundo, talvez inconformado com a orfandade anunciada que veio com o derradeiro episódio, amaldiçoava os roteiristas no domingo, eu em certa medida me deleitava. Embora concorde que as duas últimas temporadas de GOT deixaram muito a desejar, por conta de não serem baseadas em obras já publicadas do escritor George R. R. Martin, o desfecho da saga me emocionou por razões muito minhas. Achei linda a melancolia com que a série deu seus derradeiros suspiros.
À exceção do destino trágico dado a Daenerys Targaryen (Emilia Clark), a rainha dos dragões, personagem feminina muito potente, porém reduzida a uma enlouquecida senhora das guerras na reta final, achei corajosa a decisão dos roteiristas de evitar finais absolutamente felizes para os protagonistas sobreviventes.
Tyrion (Peter Dinklage), o anão vigarista, outrora quase um sátiro, foi poupado e elevado à condição de “Mão” do rei Bran Stark, o Quebrado (Isaac Hempstead Wright), mas termina só, assim como todos os do clã Stark: Sansa (Sophie Turner), coroada rainha do independente Reino do Norte, não tem um rei para chamar de seu; a guerreira Arya (Maisie Williams), talvez a grande heroína da série, opta por desbravar sozinha novas fronteiras ao Leste, enquanto um amargurado Jon Snow (Kit Harrigton) é condenado a passar o resto de seus dias para além da Muralha, no extremo e enregelado Norte, sem direito a uma companheira. Não há amor em Westeros. Apenas como nostalgia.
Das mais tocantes no último episódio é a imagem da lady Brianne de Tarth (Gwedolyn Christie), escrevendo à mão, em um livro, o fim da triste história de seu amado Jaime Lannister (Nikolaj Coster Waldau), que morreu protegendo sua rainha, amante e irmã, a cruel Cersei (Lena Headey). A complexa Brienne, cuja identidade de gênero difusa, imprecisa, é um dos pequenos grandes tesouros de Game of Thrones despertou em mim a vontade de revisitar as primeiras temporadas. Sinal de que valeu a pena a jornada, de que tantos domingos diante da TV não foram em vão.